Padres da Igreja e Doutores da Igreja

Jacob Jordaens, 'Os Quatro Doutores da Igreja'

EM SÍNTESE: DOUTOR da Igreja é aquele cristão ou aquela cristã que se distinguiu por notório saber teológico em qualquer época da história. O conceito de Doutor da Igreja difere do de Padre da Igreja, pois o Padre da Igreja é aquele que contribuiu para a reta formulação dos artigos da fé até o século VII no Ocidente e até o século VIII no Oriente. Há Padres da Igreja que são Doutores: os quatro maiores Padres latinos (Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Jerônimo e São Gregório Magno) e os quatro maiores Padres gregos (Santo Atanásio, São Basílio, São Gregório de Nazianzo e São João Crisóstomo).

A inscrição de Santa Teresinha de Lisieux entre os Doutores da Igreja despertou a atenção do público para o conceito de tal título. Que significa ser “Doutor(a) da Igreja”? – Eis o que procura­remos esclarecer.


1. Doutores da Igreja: quem são?

Os Doutores da Igreja são homens e mulheres ilustres que, pela sua santidade, pela ortodoxia de sua fé e principalmente por seu eminente sa­ber teológico, atestado por escritos vários, foram honrados com tal título por desígnio da Igreja.

Os Doutores se assemelham aos Padres da Igreja, dos quais tam­bém diferem, corno se verá a seguir.

Padres da Igreja são aqueles cristãos (bispos, presbíteros, diáconos ou leigos) que contribuíram eficazmente para a reta formulação das ver­dades da fé (SS. Trindade, Encarnação do Verbo, Igreja, Sacramentos...) nos tempos dos grandes debates e heresias. O seu período se encerra em 604 (com a morte de S. Gregório Magno) no Ocidente e em 749 (com a morte de S. João Damasceno) no Oriente.

Para que alguém seja considerado Padre da Igreja, requer-se antiguidade (até os séculos VII/VIII), ao passo que isto não ocorre com um Doutor.

Para os Padres da Igreja, basta o reconhecimento concreto, não explicitado, da Igreja, ao passo que para os Doutores se requer uma proclamação explicita feita por um Papa ou por um Concílio.

Para os Padres, não se requer um saber extraordinário, ao passo que para um Doutor se exige um saber de grande vulto.

Por conseguinte, o que caracteriza um Padre da Igreja é princi­palmente a sua antiguidade; ao contrário, o Doutor se identifica principalmente pelo seu saber notório. Isto, porém, não impede que haja Padres da Igreja que também são Doutores, como visto. Esta terminologia, precisa como é, não era usual na antiguidade, pois a palavra doutor tinha o sentido de docente, mestre, de modo que eram doutores antigamente aqueles que conheciam bem os artigos da fé e os sabiam explanar com clareza. São Paulo parece aludir a este sentido amplo de mestre, quando diz que o Senhor “cons­tituiu apóstolos, profetas, evangelistas, pastores em sua Igreja” (cf. Ef 4,11; 2Cor 12,28; At 13,1).

Com o tempo, o titulo de Doutor foi-se tornando mais especifico; a princípio era atribuído somente a Padres da Igreja, isto é, aqueles Padres que sobressaíram por seu brilho doutrinário.

Interessante é notar que nenhum mártir foi proclamado Doutor da Igreja (tal poderia ter sido o caso de São Cipriano de Cartago, vigoroso defensor da unidade da Igreja), e não o foi porque o martírio é con­siderado o maior título de glória, que não necessita de algum comple­mento para enaltecer a figura do cristão.

No século XVI, a Igreja abriu mão da nota da antiguidade e pas­sou a designar como Doutores figuras de épocas mais recentes. A primeira proclamação neste sentido foi feita pelo Papa S. Pio V, aos 11/4/1567, em favor de Santo Tomas de Aquino (+ 1274). Outras procla­mações ocorreram posteriormente, como se depreende da lista publicada ao final deste.

Além dos Doutores reconhecidos na Igreja inteira, há os que possuem tal título apenas em determinado país ou ambiente. Tal é o caso de Santo Leandro de Sevilha (+ 604), doutor na Espanha, e São Próspero da Aquitânia (+ após 455), Doutor entre os Cônegos Regulares do Latrão.


2. Os 36 Doutores da Igreja
(até setembro de 2015)

Lista por nome, função, ano de falecimento, país de origem e principais obras

1) Hilano de Poitiers, Bispo, 367, França (A Trindade; Comentário aos Salmos; Comentário a S. Mateus);

2) Atanásio, Bispo, 373, Egito (A Encarnação do Verbo; Apologia Contra os Arianos);

3) Efrém, Diácono, 378,  Síria (Comentários a Bíblia, Poemas de Nísibe);

4) Basílio, Bispo, 379, Turquia (Tratado do Espírito Santo);

5) Cirílio, Bispo, 386, Palestina (Catequeses; Jerusalém);

6) Gregório Nazianzeno,  Bispo, 390,  Turquia (Homilias; Cartas,Versos);

7) Ambrósio, Bispo, 397, Itália (Comentário do Evangelho de Lucas; Tratado da Virgindade);

8) João Crisóstomo, Bispo, 407, Turquia (O Sacerdócio; Homilias, Cartas);

9) Jerônimo, Monge, 419, lugoslávia (Vulgata);

10) Agostinho, Bispo, 430, Argélia (Confissões; Cidade de Deus; A Trindade; Cartas);

11) Cirilo de Alexandria, Bispo, 444, Egito (Comentário de S. João; Contra Nestório);

12) Pedro Crisólogo, Bispo, 450, Itália (Homilias);

13) Leão Magno, Papa, 461, Itália (Homilias; Cartas);

14) Gregório Magno, Papa, 604, Itália (Moral; Diálogos);

15) Isidoro de Sevila, Bispo, 636, Espanha (Etimologias);

16) Beda, o Venerável, Monge, 735, Inglaterra (História Eclesiástica dos Anglos);

17) João Damasceno, Monge, 749, Síria (Contra os Iconoclastas);

18) Pedro Damião, Cardeal, 1072, Itália (O Livro de Sodoma; Vida de S. Romualdo; Sermões);

19) Anselmo, Bispo, 1109,  Inglaterra (Monologion; Proslogion; A Verdade; Cartas);

20) Bernardo, Abade, 1153, França (A Graça; Para Eugênio III; Sermões sobre o Cântico dos Cânticos);

21) Antônio de Pádua, Frade, 1231, Portugal (Sermões);

22) Tomás de Aquino, Frade, 1274, Itália (Suma Teológica; Contra Gentiles; Com. de Pedro Lombardo);

23) Boaventura, Cardeal, 1274 Itália (Apologia dos Pobres; Itinerário do Espírito a Deus);

24) Alberto Magno, Bispo, 1280, Alemanha. (38 vol.s sobre Ciência, Teologia, Filosofia, Bíblia);

25) Catarina de Sena, Religiosa, 1380, Itália (Diálogo, Cartas);

26) Teresa de Ávila, Monja, 1582, Espanha (Autobiografia; Caminho da Perfeição; Castelo Interior ou As Moradas);

27) João da Cruz, Frade, 1591, Espanha (Cântico Espiritual; Subida do Carmelo; Noite Obscura);

28) Pedro Canísio, Padre, 1597, Alemanha (Catecismo);

29) Lourenço de Brindisi, Frade, 1619,  Itália (Comentário do Gênesis; Sermões);

30) Roberto Belarmino Cardeal, 1621, Itália (Controvérsias);

31) Francisco De Sales, Bispo, 1622, França (Introdução à vida devota; Tratado do Amor de Deus);

32) Afonso Maria de Ligório, Bispo, 1787, Itpalia (Prática de amar a Jesus Cristo; A oração);

33) Teresa de Lisieux, Monja, 1897, França (Autobiografia);

34) João de Ávila, Presbítero, 1569, Espanha (Audi, filia; Epistolário Espiritual para todos os Estados; O Conhecimento de Si Mesmo; Tratado sobre o Sacerdócio): 

35) Santa Hildegarda de Bingen, 1179, Alemanha (Trilogia Liber scivias Domini, Liber Vitae Meritorum, Liber Divinorum Operum);

36) Gregório de Narek, Monge, 1005, Armênia (O Livro das Lamentações ou Narek).


Alguns Doutores receberam um aposto que caracteriza sua perso­nalidade:

Santo Anselmo de Cantuária, Doutor Mariano (devoto de Maria SS.)

São Bernardo de Claraval, Doutor Melífluo (dotado de palavra doce como o mel)

Santo Antônio de Pádua, Doutor Evangélico (exímio pregador do Evan­gelho)

Santo Tomás de Aquino, Doutor Angélico, Comum

São Boaventura, Doutor Seráfico

Santo Alberto Magno, Doutor Universal (grande erudito também nas ciências naturais de sua época)

Santo Afonso Maria de Ligório, Doutor Zelosíssimo (sábio moralista)

Santa Teresinha se distinguiu no campo da Espiritualidade ou da Ascética e Mística. Desenvolveu as palavras do Senhor Jesus que convi­dam os fiéis a se tornar crianças espirituais (cf. Mt 18,3s) vivendo como filhos bem-amados na Presença de Deus. A monja carmelita dedu­ziu profundas conclusões dos dizeres do Senhor, que ela explanou com simplicidade na sua autobiografia intitulada “História de uma Alma” e em escritos paralelos, inclusive poesias. Essas obras fizeram enorme bem à Igreja, o que justifica plenamente o título de Doutora que lhe foi conferido pelo Papa João Paulo II aos 19/10/97.

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Fonte:
• BETTENCOURT, Estevão, osb, Revista 'Pergunte e responderemos' nº 429, Ano 1998 – p. 87
• Ag. Eclesia, artigo 'História: Os 36 doutores da Igreja (elenco)', disp. em:
agencia.ecclesia.pt/noticias/vaticano/historia-os-36-doutores-da-igreja-elenco/
Acesso 19/9/015

5 comentários:

  1. Alcidio Antonio Tsenane23 de setembro de 2015 às 02:04

    Bom dia. Aqui Alcidio de Mocambique. Gosto muito deste site, aprendo muito.

    Gostaria de ter uma aula, uma explicacao sobre a Sola Fide dos protestantes. Qual e' a fe' catolica em relacao a esta material?

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    Respostas
    1. Caro Alcidio,

      Este site já abordou este tema em diversos posts. Creio que alguém lhe mandará uma resposta específica. Por isso aproveito e lhe faço as seguintes recomendações:

      Neste link tem a resposta que procura e outras mais:

      http://www.ofielcatolico.com.br/2000/01/indice-de-respostas-catolicas-para.html

      Sugiro também os vídeos e textos do site do Pe. Paulo Ricardo:

      http://padrepauloricardo.org

      Outas fontes: Prof. Felipe Aquino, blog O Catequista, etc.

      Nestes site encontrará bastante material para conhecer e fortalecer a fé católica.

      Paz e Bem!

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    2. Sobre a "sola fide", leia Tiago 2, que claramente nos diz que a fé sem obras é morta.

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    3. Caro Alcídio, neste vídeo abaixo

      https://m.youtube.com/watch?t=46s&v=mbCmErqFXfQ

      O padre Leonardo fala sobre o assunto de forma bem simples. A ideia que ele coloca é a seguinte: ter fé em Deus é um mandamento? A resposta é não. Ter fé em Deus é apenas um pré requisito para se obedecer os mandamentos. Portanto se a pessoa tem só a fé, mas não obedece os mandamentos , isto não salvará a pessoa. Até o demônio tem fé.

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