Frei Galvão: histórias do ainda desconhecido santo brasileiro


GRATA SURPRESA terá quem ler o singelo livro da jornalista e pesquisadora Marleine Cohen, lançado no ano 2013 pela editora Benvirá, intitulado "Frei Galvão: a história do primeiro santo brasileiro".

Com simplicidade (mas sem perder a necessária profundidade) e correção, a autora nos leva a conhecer a vida e a obra deste grande personagem da Igreja de Nosso Senhor no Brasil. Com uma linguagem envolvente e leve, que faz com que não se queira largar o livro antes de concluir a leitura, a obra me deu a nítida impressão de conhecer pessoalmente o queridíssimo frei, de ter presenciado algumas passagens de sua impressionante vida de santidade (confesso que determinado trecho me levou às lágrimas, eu que não sou nem nunca fui 'chorão'). A pesquisa foi bem feita e merece respeito. Recomendo a leitura a todos os leitores fiéis católicos. Abaixo, reproduzo pequeno trecho da obra:

Coroando a figura de frei Galvão, os dons que manifestou ao longo da vida – e que orbitaram em torno dele,m aonde quer que fosse, como que para confirmar sua santidade – transformaram-no no mítico sacerdote das mil e uma graças que nenhum fiel jamais esquece.

 – Ué, senhor padre, então "vossemecê" anda sem pisar no chão?

A curiosa observação, feita por uma senhora idosa que vinha caminhando em sentido contrário quando a vistou o frade todo recolhido, como que... voando, encontra eco em numerosos testemunhos, guardados a sete chaves no Mosteiro da Luz, acerca da capacidade que ele tinha de levitar.

Essa fama de “levitador” deu origem ao seguinte refrão, identificado pelo historiador Afonso d’Escragnolle Taunay em Limeira:

"Nas minhas aflições
dai-me consolação
senhor meu frei Galvão
que não pisais no chão"

A quadrinha varreu cidades e foi se instalar em Araras, não sem antes amedrontar, fato comprovado, um bando de meninos que brincava numa fazenda no interior paulista. Certa feita, tarde da noite, assim que o frei se recolheu, as crianças pararam com suas brincadeiras para dedicar-se a uma em especial: descobrir o que o padre estaria fazendo no quarto. Amontoados debaixo da janela, um deles se acocorou sobe os demais e arriscou uma espiadinha para dentro do aposento. Arregalando os olhos, antes de sair em disparada, pôs-se a gritar: ‘Frei Galvão está voando! Frei Galvão está voando pelo ar!”. E pernas para que vos quero!

Nem sempre, porém as fantásticas habilidades de frei Galvão assustaram os fiéis. Ao contrário. Certa vez, no distrito de Potunduva (Airosa Galvão), município de Jaú, o seu dom de bilocação, longe de mantê-lo à distancia, resultou em que, poucas vezes, sua presença fosse tão suplicada.

Aconteceu na Fazenda Santa Cruz, nos idos de 1810, às margens do rio Tietê, na orla do sertão.

Naquela época, conta Afonso Taunay,

"no bairro de Potunduva, todos os moradores viviam do tráfego das monções1. Ali residiam algumas famílias de caboclos, cujos homens se empregavam como proeiros, remeiros e varejeiros dos canoões das flotilhas a trafegarem entre Porto Feliz e Cuiabá.
Entre os mestres das monções, era particularmente prestigioso Manuel Portes, graças à ordem que sabia manter entre as tripulações, o cuidado, ou antes, o rigor com que executava as encomendas e escrupulosa fidelidade na entrega de dinheiro e mercadorias. Era um mameluco de prodigiosa energia, hercúleo e violento, sobremodo propenso a deixar-se arrebatar pela cólera. Seus subordinados o temiam imenso, pois não trepidava em castiga-los do modo mais rude. 
Os negociantes de São Paulo e Mato Grosso nele depositavam grande confiança. E muitos esperavam ansiosos a sua presença de capataz de monção reiuna2 para lhe entregarem a mercadoria.
Vinha este sertanista conduzindo a monção reiuna que subia o Tietê rumo a Porto Feliz. Tinha queixas da desídia de um de seus homens (...), um certo Apolinário, caboclo indolente e pouco afeito à disciplina férrea do mestre. Já o repreendera este várias vezes e o ameaçara, e o homem se humilhara, mas não se emendara. Abicados os canoões à barranca do Tietê e desembarcadas as equipagens, para o jantar, pusera-se Manuel Portes à fazer a costumeira revista e ronda diária. E aí apanhara novamente o caboclo em falta.
Deixara-se então levar a uma das frequentes cóleras furibundas. Tomando uma açoiteira, chibateara rijamente o remeiro, que, aliás, não se defendera.
Pouco depois, estava Portes conversando com um de seus homens quando inesperadamente sentiu um forte murro às costas. Voltando-se, viu Apolinário que fugia a correr, empunhando enorme facão. Terrível fora a punhalada, não tardando que o apunhalado caísse prostrado por enorme hemorragia.
Sentindo que a vida o abandonava, no auge do desespero, Manuel Portes se pôs a gritar: ‘Meu Deus, eu morro sem confissão! Virgem Mãe de Deus, perdão! Perdão! Senhor Santo Antônio, pedi por mim! Dai-me confessor! Vinde, frei Galvão, assistir-me!'."

E Afonso de Taunay continua a descrição:

"De todos os lados acudiram os comandados, e dentro em breve estava ele por terra moribundo, já com voz sumida, a pedir a presença de um padre, a clamar por Nossa Senhora e os santos de sua devoção. Cercavam-no os homens da monção, impressionados com aquele desespero piedoso.
Mas onde, naquela selva, arranjar confessor que confortasse o moribundo?
Subitamente, gritou um dos circunstantes 'Aí vem um padre!'. E todos de olhos esbugalhados, absolutamente estarrecidos, viram um franciscano que se adiantava para o agonizante. Nele reconheceram frei Galvão, cuja figura lhes era familiar (...)."

Assim relataram as testemunhas:

"Aproximou-se o querido sacerdote, afastou com um gesto os espectadores da trágica cena, abaixou-se, sentou-se, pôs a cabeça de Portes sobre o colo em falou-lhe em voz baixa, encostando-lhe depois o ouvido aos lábios. Ficou assim alguns instantes, findos os quais abençoou o expirante. Levantou-se, então, fez um gesto de adeus e afastou-se de modo tão misterioso quanto aparecera, deixando estáticos os presenciadores de tão estranha ocorrência, certos de haverem presenciado um milagre."

Altar-Mor da Igreja do Mosteiro da Luz

Mas como pode? Reza o consenso popular que naquele instante frei Galvão se encontrava em São Paulo, pregando. Pois fato é que ele interrompeu a pregação pediu que se rezasse uma Ave-Maria pela salvação de um moribundo em lugar distante e, acabada a oração, levantou-se e prosseguiu com o seu sermão.

No Porto de Potunduva, sepultaram Manuel Portes sob um tosco cruzeiro. Mais tarde , no mesmo local onde uma tabuleta sustentava uma pirogravura representando o frade menor ouvindo a confusão de um moribundo, em alusão ao fato, foi erguida a Capelinha de Frei Galvão, que as águas de uma enchente arrastaram em 1950.

Essa tabuleta desapareceu – não se sabe como nem quando. Uns dizem que foi consumida pelo fogo dos círios acesos pelos devotos; outros sustentam que se perdeu porque os canoeiros do Tietê tinham o costume de leva-la consigo em suas viagens, à guisa de proteção. Seja como for, não faltou quem levantasse outra capela, sólida e definitiva, em local mais seguro. Em torno dela ainda ondeia a devoção popular, com sua festa estabelecida em 3 de maio.

Mas frei Galvão não só levitava e aparecia em dois lugares ao mesmo tempo: tinha o dom da telepatia e se comunicava à distância, por transmissão de pensamento e sensações. Sua premonição e telepercepção, isto é, a faculdade de prever o que vai acontecer e de tomar conhecimento de fatos ocorridos em regiões afastadas, também eram bastante apuradas. Além disso, era clarividente. Conta-se que, certo dia, os sinos do Mosteiro da Luz tocaram insistentemente fora de hora. Sempre que acontecia, a população atendia à convocação, temerosa: era como um alerta de que algo inusitado estava em curso.

Já bem idoso, frei Galvão tomou a palavra para anunciar: 

 – Rebentou uma revolução em Portugal – e pôs-se a descrever os detalhes do conflito, como se os estivesse vendo diante dos olhos.

Semanas depois, notícias do além-mar davam conta do fato: no dia 24 de agosto de 1820, eclodira no Porto um movimento com o objetivo de convocar as cortes e dotar Portugal de uma constituição.

Levitações, (bilocação) telepercepções, clarividência: tão preciosa lavra espiritual teria se perdido no tempo, não tivesse ela sido revestida de um húmus especial: as chamadas pílulas de frei Galvão, que deram perenidade às suas graças e ainda hoje o mantém quase vivo entre seus numerosos devotos em todo o mundo.

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Notas:
1. Antigas bandeiras ou expedições que partiam em exploração pelo interior, descendo e subindo rios das capitanias de São Paulo e Mato Grosso, nos séculos XVIII e XIX, pondo-as em comunicação. – Dicionário MICHAELIS, Melhoramentos, 2013.
2. Diz-se de certa espingarda ou fuzil de cano curto (hoje em desuso) – Idem.
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 Fonte:
COHEN, Marleine. Frei Galvão: a história do primeiro santo brasileiro. São Paulo: Benvirá, 2013, pp. 80-86.
www.ofielcatolico.com.br

6 comentários:

  1. Santo Antonio de Sant’Ana Galvão, rogai por nós!

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  2. Fiquei instigado a conhecer mais sobre esse santo após este post. Excelente iniciativa! Parabéns por nós mostar outra vez mais a beleza da nossa Santa Igreja. Fraterno abraço, paz e bem!

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  3. Salve Maria!

    Duas notícias despertaram a minha atenção. A primeira se refere a um projeto de uma organização judaica que visa construir o que chamam de "Terceiro Templo": http://noticias.gospelprime.com.br/arrecadacao-construcao-terceiro-templo/

    A segunda se refere ao "julgamento" do Santo Padre por um grupo de rabinos: http://noticias.gospelprime.com.br/papa-francisco-sinedrio-israel/

    Li em alguns sites católicos (não estou tão certo quanto à confiabilidade dos mesmos) que, entre os sinais precursores do retorno glorioso de Cristo, ocorreria a reconstrução do Templo de Jerusalém. Alguns citam frases atribuídas aos Santos Padres e outros santos católicos.

    O que o senhor Henrique Sebastião teria a dizer sobre estes eventos? Sei que a Igreja evita certas especulações, mas é possível emitir alguns comentários relevantes sobre isto, à luz da Tradição da Igreja?

    Peço desculpas por fugir do tema tratado no post.

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    1. Caro anônimo, a Paz do Nosso Senhor Jesus Cristo! E Salve Maria!

      Quanto a construção do terceiro templo em Jerusalém, o que podemos fazer é senão vigiar. E orar! Quanto ao julgamento do Papa no sinédrio, o que é uma idéia absurda, um comentarista escreveu naquele tablóide, com algumas correções minhas:

      ''O Papa Francisco será julgado num sinédrio judaico por antissemitismo, nenhum evento atual caracteriza com tanta força que a Igreja Católica é a Igreja primitiva. O último Papa a ser julgado num sinédrio israelita foi São Pedro juntamente com outros Apóstolos (At 5,17-18). Era o sinédrio, a assembléia de juízes judeus, composta por mestres da lei, fariseus e saduceus, o conselho o qual segundo São Paulo julgava crimes contra o povo judeu toda esperança na ressurreição dos mortos depositada na Fé em Jesus Cristo (At 23,6). Nosso Senhor Jesus foi também julgado pelo mesmo tribunal como um inimigo do povo judeu (Mt 26,57-68/ Mc 14,53-65/ Lc 22,63-71/ Jo 18,12-24) e não é de se estranhar que o mesmo ocorra a um sucessor de São Pedro, pois o próprio Deus garantiu ao dizer a seus Apóstolos: "Acautelai-vos, porém, dos homens; porque eles vos entregarão aos sinédrios (...)" (Mt 10,17). As promessas apostólicas estão vivas na Igreja.'' By Sabrina Marcel Oliveira.

      Os idólatras de Israel, como eu chamo esse povo que incensa os judeus e defendem o Estado de Israel IN-CON-DI-CI-O-NAL-MEN-TE (e eu sou pró-Israel!) agem como fariseus, Israel que negou Jesus Cristo (Mt 23,37-39), o verdadeiro Messias, que disse: ''Vim em nome de meu Pai, mas não me recebeis. Se vier outro em seu próprio nome, haveis de recebê-lo'' (Jo 5,43). Não quero nem imaginar quem é esse outro (arrepio na espinha)... Quem é mentiroso senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? Esse é o Anticristo, que nega o Pai e o Filho (1 Jo 2,22). O judeus estão esperando o seu Messias até hoje. Houve um rabino que chamou um pastor protestante de idólatra por causa de Jesus Cristo — não é hilário? —, e mandou-o ir direto ao Pai [1]. Ninguém vai ao Pai, senão por Jesus Cristo (Jo 14,6).

      ''Por isso vos digo: ser-vos-á tirado o Reino de Deus, e será dado a um povo que produzirá os frutos dele (Mt 21,43)''. E assim foi cumprida a profecia de Cristo sobre Israel. Ademais, em Roma sempre houve uma colônia de judeus que foi protegida pelo papado, como inclusive reconheceu o judeu Dr. Cecil Roth, especialista inglês em ''História do Judaísmo'' [2]. E o Papa Francisco JAMAIS chamou Abbas de ''anjo da paz'' [3], como foi inicialmente noticiado, por isso essa celeuma dos que idolatram o Estado de Israel. Oremos pela conversão de Israel (Os 14,1).
      ________________________

      [1] ''Resposta judaica a um pastor (legendas em português)'', Youtube.

      [2] ''Inquisição e tortura'', Montfort.

      [3] Pope Francis Did Not Call Abbas an ‘Angel of Peace’, National Review./ ''Did the Pope Actually Call Abbas an ‘Angel of Peace’?'', News Week.

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    2. Muito obrigado pela resposta, amigo.

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  4. Frei Galvão foi sem dúvida alguma um grande santo, um homem fiel a Deus. Que ele no Céu peça a Jesus por nós.

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