Bono Vox, do U2: "O capitalismo tira mais pessoas da pobreza do que doações!"


O PROF. GEORGE AYITTEY (foto), pesquisador do Independent Institute, conheceu há alguns anos o astro do rock irlandês Bono Vox, da banda U2, durante uma conferência TED. E lembra-se bem da conversa que tiveram, e da impressão que as ideias do artista lhe causaram.

O Prof. Ayittey estava discursando e, ao saber que Bono estava na plateia, disse: “Fiz um esforço especial para demolir a instituição da ajuda externa"… Conta ele: "Mais tarde, Bono disse que havia gostado do meu discurso, mas não concordava comigo que a ajuda externa não é eficaz para acabar com a pobreza. Então, dei-lhe um exemplar do meu [brilhante] livro "Africa Unchained: The Blueprint for  Africa's Future” ('África Desacorrentada: Plano para o Futuro').


Bono com o livro e seu autor, à sua esquerda

Bono Vox (o nome de batismo é Paul David Hewson) é vocalista de uma das bandas de rock mais bem sucedidas da história, e se tornou um grande defensor da expansão da ajuda externa dos EUA e de outros programas do governo (como o cancelamento da dívida) para aliviar a situação de sofrimento no mundo, seja relacionado às epidemias de AIDS e malária e à pobreza extrema, entre outras questões.

Bono foi ainda co-fundador e Diretor Executivo da empresa de capital de risco Elevation Partners, e tornou-se um dos músicos mais ricos do mundo (talvez o mais rico) depois de investir no lançamento das ações do Facebook, o que rendeu mais de US$ 1,5 bilhão(!) para a empresa.



Bono também é declaradamente cristão (veja aqui, aqui e aqui), filho de pai católico e mãe protestante. Seu encontro com São João Paulo II tornou-se famoso, quando o Papa fez questão de experimentar os célebres óculos personalizados do "cheio de estilo" Bono Vox (foto). O músico declarou ainda em seu livro "Bono on Bono" (p. 201): "Quanto mais velho eu fico, mais encontro conforto no catolicismo romano".

Admirador da obra de C. S. Lewis1, Bono usou trechos de sua obra "The Screwtape Letters" ('As Cartas do Inferno'), no vídeo para a música "Hold Me, Thrill Me, Kiss Me, Kill Me", tema do filme "Batman Forever". Recentemente, ele deu a entender em uma entrevista a Jim Daly, na "Focus on the Family", que Lewis poderá inspirar também o próximo álbum do U2. Segue:

Bono: É muito chato seguir esta Pessoa de Cristo em todo lugar (rindo), porque Ele exige muito da sua vida.

Daly: É muito difícil...

Bono: E é impossível tentar manter-se à altura.

Daly: Na verdade, Bono, C. S. Lewis tem uma citação que eu adoro: “Quando um homem está ficando melhor, ele compreende cada vez mais claramente o mal que restou nele. Quando um homem está ficando pior, ele entende a sua própria maldade cada vez menos”. Isso é forte, não é?

Bono: Sim, pode até ser que isso venha a ser o próximo álbum do U2, mas não vou dar crédito nenhum a ele nem a você (risos).

+ + +

Recentemente, baseando-se em sua fé cristã (e possivelmente sob a influência econômica do Professor Ayittey?), em um discurso na Universidade de Georgetown, Bono mudou seu ponto de vista econômico e político e declarou que só o capitalismo pode acabar com a pobreza (reconhecendo que, dentre os sistemas político/econômicos de que o ser humano dispõe, o melhor ou no mínimo o 'menos pior' ainda é o capitalismo).

“A ajuda assistencial é apenas um paliativo”, disse o artista. – “O comércio e o capitalismo empreendedor tiram mais pessoas da pobreza do que a mera ajuda. Precisamos que a África se torne uma potência econômica".

Bravo! Um expoente do pop, um ícone da música, um artista  reconhecido e "antenado" com o mundo finalmente percebeu o óbvio! Bono encorajou os alunos de Georgetown a pensar no que podem fazer para apoiar efetivamente as pessoas na África e em outros países em desenvolvimento (como o Brasil) que têm necessidade de justiça e conforto. E refez a velha questão usando de outras palavras: o que ajuda mais? Dar um peixe ou ensinar a pescar? O que leva mais dignidade ao ser humano em situação de miséria? Capacitá-lo, dar-lhe condições para que se erga, torne-se produtivo e construtor de sua própria história, ou mantê-lo cativo de verdadeiras esmolas estatais, na forma de doações governamentais que, além de tudo, lhe tornam refém de determinados partidos políticos?

Em sua fala, Bono comparou o esforço pelo crescimento, seja temporal ou espiritual, ao comprometimento de Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, em servir aos outros. – “Isso é o que estou esperando que aconteça aqui em Georgetown com vocês”, disse ele.  – "Porque quando você aceita, de fato, que as crianças em algum lugar distante da aldeia global têm o mesmo valor que você aos olhos de Deus, ou até mesmo apenas aos seus olhos, então a sua vida muda para sempre, você vê algo que não poderá mais deixar de ver".

C. S. Lewis compreendeu bem a falácia e mesmo o mal do estatismo ao abordar as dores e o sofrimento de nosso mundo, e que o paternalismo estatal não é capaz de sanar o mal da pobreza, ao contrário: acaba por perpetuá-la. Congratulamo-nos com a nova percepção de Bono Vox sobre o assunto. O trabalho marcante do Professor Ayittey também pode ser encontrado no livro "Making Poor Nations Rich: Entrepreneurship and the Process of Economic Development" ('Tornando Ricos os Países Pobres: o Empreendimento e o Processo do Desenvolvimento Econômico'], do Independent Institute, editado por Benjamin Powell.

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1. Pensador cristão de forte influência no século passado. Apesar de não ter abraçado o catolicismo, Lewis paradoxalmente tem sido responsável por um grande número de conversões de protestantes ao catolicismo, em especial de pentecostais, devido ao praticamente perfeito alinhamento de suas ideias com a doutrina católica. Sheldon Vanauken compara Lewis com Moisés: conduziu o povo à terra prometida sem que ele próprio entrasse nela. Segundo Christopher Derrick, seu grande amigo e discípulo, os leitores de Lewis, seguindo suas percepções e princípios teológicos, são muitas vezes capazes de perceber algo que o próprio autor, em razão de problemas de natureza psicológica não enxergou por si mesmo.

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• Ref.: este post contém trechos do artigo "
Bono: o capitalismo tira mais pessoas da pobreza do que as doações", do website do Instituto Liberal, disponível em:
institutoliberal.org.br/blog/bono-o-capitalismo-tira-mais-pessoas-da-pobreza-do-que-as-doacoes/
Acesso: 29/4/014.

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Católica e protestante: por que existem Bíblias diferentes?

O ESTUDO QUE ORA apresentamos vem sendo solicitado desde o início deste nosso trabalho: traz respostas para perguntas que, de tempos em tempos, sempre nos fazem, e que já foram dadas em outras páginas católicas competentes, mas que faltavam aqui. Procuramos condensar e aprofundar estas respostas. Que sejam úteis a todos aqueles que, de boa vontade, procuram a Verdade.


Qual a diferença entre a Bíblia católica e a protestante?

A diferença entre a Bíblia católica e a protestante está no Antigo Testamento (AT). O Novo Testamento (NT), que constitui o eixo e o cumprimento de toda a fé cristã, é exatamente igual, tanto para católicos quanto para protestantes, contendo os mesmos 27 livros, que vão do Evangelho de Mateus até o Livro do Apocalipse. – A diferença, então, está no cânon dos livros do AT. Em outras palavras, a diferença está na lista dos livros que compõem o AT: para os católicos, são 46 livros; na Bíblia protestante, são 39, sendo que faltam os livros de Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, Carta de Jeremias e os livros dos Macabeus, além de partes de Daniel e Ester. Estes livros são os chamados "deuterocanônicos", e veremos o que isso significa mais adiante. Veja a lista completa dos livros da Bíblia católica neste link.

A diferença vem de longe e tem uma longa história. Como foi acontecer, quando e por quê? É o que veremos a seguir.


Qual a origem da diferença? O começo da história...

O povo católico, ao longo do tempo, sempre observou a orientação do Magistério da Igreja, isto é, a orientação dos Apóstolos escolhidos diretamente por Jesus e seus sucessores, que dão testemunho de que o Evangelho transmitido e a fé confessada são os mesmos ensinados pelo Cristo. Somente no século XVI é que surgiu o grupo denominado protestante, que renegou a autoridade do Magistério da Igreja. Esse grupo acreditava, entre outras coisas, que a Igreja Católica havia se corrompido e que eles deveriam retomar os costumes da "igreja primitiva"; – evidentemente, conforme eles imaginavam que seriam esses costumes.

Nesse processo, os protestantes acabaram descobrindo que os judeus tinham uma lista diferente de livros sagrados. Depois de Lutero, o pai do protestantismo, sobreveio um período de intensas disputas, de uma rivalidade que crescia, e tudo servia como pretexto para aprofundar ainda mais o abismo da separação entre os que confessavam a fé em Jesus Cristo. Era uma questão de tempo até que os protestantes deduzissem que a "terrível" Igreja Católica tinha acrescentado livros à Bíblia.

Muitos pensam que foi Lutero quem retirou os sete livros da Bíblia cristã, o que é um engano bem primário. Na realidade, a mudança foi um processo lento, e foi somente no século XIX que os protestantes decidiram abolir de vez os sete livros chamados deuterocanônicos de sua lista.

O AT foi escrito originalmente em hebraico e aramaico: seus livros compõem a Bíblia judaica, chamada Mikrá ou, mais popularmente, Tanakh. Esta é constituída dos livros da Lei (Torá ou Chumash, os cinco primeiro livros da Bíblia cristã, o Pentateuco), os livros dos Profetas (Neviim) e os livros chamados Escritos (Ketuvim). Interessante notar que o processo de canonização desses livros, pelos judeus, também foi muito lento. Primeiro foram canonizados os livros da Torá, depois os dos Profetas e, somente muito tempo depois os dos Escritos. Para que se tenha uma ideia, na época de Jesus o cânon (a lista 'oficial') da Bíblia judaica ainda não estava fechado: os judeus contemporâneos de Jesus ainda debatiam sobre quais seriam os verdadeiros livros sagrados(!). Os saduceus, por exemplo, só aceitavam os livros da Torá; os fariseus aceitavam também os Profetas e os Escritos, mas não totalmente, entendendo que a inspiração dos Escritos ainda não estava concluída.

Nosso Senhor Jesus Cristo deu a ordem que todo cristão conhece bem: os Apóstolos deveriam ir pelo mundo a evangelizar todos os povos. Ocorre que a língua mais falada no mundo daquela época era o grego. Logo, os Apóstolos começaram a pregar o Evangelho em grego, e passaram a utilizar a tradução das Escrituras denominada Septuaginta ou Tradução dos Setenta, que havia sido elaborada em Alexandria antes do tempo de Cristo (no séc. III aC).

A Septuaginta contém os sete livros que permanecem até hoje na Bíblia Sagrada católica, e todo biblista competente (inclusive muitos conhecidos doutores protestantes) é capaz de perceber que, em diversas citações que o NT faz do AT, a tradução utilizada é a da Septuaginta. Esse era, portanto, o conjunto dos livros sagrados utilizado pelos Apóstolos. A Igreja Católica, como única Igreja que procede diretamente de Jesus Cristo e dos Apóstolos, adotou essa mesma versão da Bíblia, e não haveria como ser diferente.

Ocorre que nos primeiros tempos da Igreja, quando os judeus perceberam que os Apóstolos pregavam o Evangelho, expulsaram-nos das sinagogas. Esse fato contribuiu para que os judeus fechassem de uma vez o cânon dos seus livros sagrados, rejeitando tudo o que era cristão. Assim, no final do século I, decidiram pela exclusão definitiva dos sete livros que constavam da Septuaginta.

Resumindo a história, portanto, vemos que o AT da Bíblia católica, com a lista completa, da Septuaginta, foi adotado e canonizado pelos Apóstolos de Cristo e seus sucessores, desde o início da Igreja; o AT da Bíblia protestante foi canonizado pelos rabinos judeus, cerca de um século depois de Cristo.

Antes e além de qualquer debate, a mais simples realidade dos fatos é esta: os protestantes, ao aceitarem o cânon da Bíblia judaica, estão aceitando a autoridade dos rabinos judeus depois de Cristo, e negando a autoridade dos Apóstolos, a quem o próprio Cristo deu autoridade sobre a Igreja.

Lembramos, por fim, que os 27 livros do NT, que os protestantes aceitam e adotam normalmente, foram definidos e canonizados pela mesma Igreja Católica que definiu e canonizou os livros do AT. Aceitam, portanto, a autoridade da Igreja para definir os livros do NT, mas não a aceitam quanto à definição dos 46 livros do AT.



Informações muito importantes

Até o terceiro século de nossa era, o cânon do NT não estava ainda definido. Haviam muitas listas de livros, entre canônicos e apócrifos (não autênticos/não inspirados). E havia muita discussão sobre quais livros deveriam integrar as Sagradas Escrituras. Assim, vemos facilmente que não há fundamento algum na  "espinha dorsal" da doutrina protestante da sola Scriptura, que afirma que "a Bíblia é a única regra de fé e prática do cristão", simplesmente porque a Igreja, nos seus primeiros quatrocentos anos (no mínimo), simplesmente não tinha a Bíblia que nós temos hoje para observar, sendo sua principal regra de fé e prática a condução do Magistério da Igreja e a observância da Tradição dos Apóstolos.

Dentro dessa realidade histórica, devemos compreender bem: a Bíblia é a Tradição dos Apóstolos por escrito, e é nesse sentido que se constitui num dos fundamentos da fé cristã, ao mesmo tempo em que depende da Igreja para ser corretamente compreendida. Como diz sempre meu colega e irmão em Cristo Lucas Henrique (Firmat Fides): "Ler as Escrituras sim, em sintonia com o pensamento do sujeito que a confeccionou: a Igreja Católica", inspirada pelo Espírito Santo.

O primeiro documento da Igreja que fez referência ao cânon da Bíblia Católica atual (46 livros do AT e 27 livros do NT) foi o do Concílio de Hipona, da época de Santo Agostinho (354-430). O Decretum Damasi, publicado no ano 382, diz: "Agora tratemos das Escrituras divinas, do que a Igreja Católica universal deve acolher e o que deve evitar". E o Catecismo da Igreja Católica (§120) atesta:

Foi a Tradição apostólica que fez a Igreja discernir quais escritos deveriam ser enumerados na lista dos Livros Sagrados. Esta lista completa é denominada 'cânon' das Escrituras". Como disse Santo Agostinho: "Ego vero Evangelio nos crederem, nisi me catholicae Ecclesiae commoveret auctoritas" – "Eu não creria no Evangelho, se a isto não me levasse a autoridade da Igreja Católica."


Por que "Deuterocanônicos"?

Em cerca de 300 ou 400 anos antes do nascimento de Jesus, muita gente imigrou da Palestina para o Egito. A primeira geração desses imigrantes falava o hebraico e o aramaico, que são línguas semelhantes. Seus filhos, porém, começaram a falar o idioma usado na terra em que viviam, e os seus netos já não entendiam mais a língua dos seus antepassados. – Algo muito parecido como o que vemos acontecer hoje com os netos de imigrantes italianos, por exemplo, que chegaram à cidade de São Paulo em inícios do séc. 20, que hoje já não falam mais a língua de seus avós.

Então sentiram a necessidade de uma tradução das Escrituras. Essa tradução foi feita aos poucos, e foi muito demorada: começou em torno do ano 250 antes de Cristo e levou quase 100 anos até ficar pronta. Foi assim que se formaram duas versões da Bíblia: uma em língua hebraica, para os judeus da Palestina, e outra em língua grega, para os judeus que viviam no Egito. Durante esse tempo, os judeus do Egito escreveram mais alguns livros em grego, e por isso a Bíblia deles ficou maior. – Num certo momento, os judeus da Palestina confrontaram as duas Bíblias e fizeram uma lista dos livros que para eles eram sagrados. Deixaram fora da lista os livros que os judeus do Egito haviam escrito, em grego. Os do Egito souberam disso, mas continuaram usando sua lista maior.

Também os cristãos adotaram a Bíblia (AT) que segue a lista dos judeus do Egito, que se espalhou por todo o mundo desde aquele tempo, pois a língua mais falada era o grego. – Por volta do ano 400 dC, o Papa Dâmaso pediu a S. Jerônimo que traduzisse a Bíblia para o latim, pois naquele tempo era a língua mais usada, e era preciso uma nova tradução que todos pudessem entender. S. Jerônimo concordou, mas não conhecia hebraico. Procurou um velho rabino judeu de Belém para ter aulas, e os dois acabaram se tornando muito amigos. Trocaram ideias sobre a Bíblia, e Jerônimo parece ter sido influenciado pelo rabino quanto às ideias dos judeus ortodoxos.

Jerônimo então denominou os 7 livros que não constavam da Bíblia hebraica como “deuterocanônicos”: deutero significa segundo; cânon significa lista. Até hoje a Igreja define com esse termo esses livros, porque foram escritos numa segunda fase da história sagrada do AT.

Durante o Concílio Ecumênico de Florença, no ano de 1439, os bispos se pronunciaram oficialmente e atestaram por documento oficial que a Igreja Católica reconhece como Escritura Sagrada todos os livros da lista usada pelos Apóstolos e adotados pela Igreja primitiva: a versão completa que temos hoje, com 46 livros do AT e 27 do NT.

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Fontes e referência:

• Pe. Paulo Ricardo de Azevedo Jr., em
http://padrepauloricardo.org/episodios/qual-e-a-diferenca-entre-a-biblia-catolica-e-a-biblia-protestante
Acesso 12/8/013 (Contém trechos do artigo do site).
• Pe. Lucas de Paul Almeida, CM (Diocese de Bauru), em
Acesso 12/5/013.
• LIMA, Alessandro Ricardo. O Cânon Bíblico, 
Brasília: DeGarcia, 2007.
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Os Documentos da Igreja e o verdadeiro desenvolvimento da Doutrina

UM LEITOR deste site, que se identifica como Kelson Vieira, enviou-nos a seguinte mensagem:

"Paz e bem!
Deixa eu ver se entendi uma coisa. Sobre os documentos da Igreja (vindos do Vaticano), estes são tão verdadeiros quanto as sagradas escrituras? Do contrario até que ponto são verdadeiros? E sobre escritos dos Doutores da Igreja, o que podemos afirmar?

São perguntas importantes. A Igreja ensina que certas compreensões da Sã Doutrina, que ela guarda e proclama, tornaram-se possíveis através de uma Revelação gradual, dada por Deus através dos tempos. Podemos dizer que esse processo vem desde o tempo do Antigo Testamento, pois Deus se comunica com o seu povo desde antes da Vinda de Cristo.

    Jesus Senhor, único Salvador da humanidade, trouxe e anunciou o Evangelho final e definitivo, mas a compreensão deste mesmo Evangelho se baseia na Revelação que se dá progressivamente no correr da História. Por isso, necessitamos sempre de constante estudo, reflexão, oração, meditação.

    Essa compreensão gradativa da Revelação, no entanto, permanece sempre fiel à Tradição, e é sempre orientada pelo Magistério da Igreja à qual foi confiada a autoridade sobre a Sã Doutrina, diretamente por Nosso Senhor. Aqui é que se encaixam os documentos da Igreja, e onde sua fundamental importância fica evidente.

    Alguns têm certa dificuldade com esta realidade, imaginando que a afirmação de que a doutrina se desenvolve com o passar do tempo é contraditória, se a Igreja Católica também afirma que sua doutrina é idêntica àquela que os Apóstolos já tinham. Existiria aí uma dicotomia?

    A resposta é não. Ocorre que existem duas categorias distintas no desenvolvimento da Doutrina: a propriedade objetiva do que é a mesma doutrina e a compreensão subjetiva desta propriedade objetiva. Uma comparação simples pode facilitar a compreensão: olhemos para os primeiríssimos cristãos: é bem provável que eles não tivessem – ao menos não formalmente –, a formulação do conceito de Trindade para falar de Deus. Todavia encontramos, nas Sagradas Escrituras, inúmeras afirmações que não deixam margem para dúvida de que já se entendia Jesus como Deus, assim como também o Espírito Santo, além de Deus Pai, e do mesmo moco é nítido que as Três Pessoas são Um só Deus. 

    Possivelmente, a evidência máxima nesse sentido esteja no Evangelho segundo S. Mateus, na passagem em que o Cristo manda batizar os conversos em Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo (28,19). Mesmo assim, não é dito explicitamente, em nenhuma parte das Escrituras, que Deus é Trindade, nem que Deus é Um em Três Pessoas coexistentes. A palavra “Trindade” não se encontra na Bíblia, e o conceito formal da doutrina da Santíssima Trindade não foi formulado nem definido formalmente pelos Apóstolos. Mesmo assim, nós sabemos muito bem que eles confessavam Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Logo, a Doutrina da Santíssima Trindade já estava presente na Revelação trazida por Nosso Senhor Jesus Cristo desde sempre, mas foi desenvolvida no correr dos tempos, por filhos eminentes da Igreja. Ela não foi “inventada” por um teólogo, pensador ou doutor, apenas compreendida e desenvolvida. Desenvolver a Doutrina é perscrutá-la, dissecá-la, observá-la para notar suas nuances, e transmiti-las aos irmãos de fé, os outros membros do Corpo do Senhor, que é a Igreja.

    Isso significa que os conceitos por trás das declarações dogmáticas que surgiram depois do período apostólico já eram essencialmente possuídos pelos Apóstolos, embora, em alguns casos, não formulados por eles. Eles conheciam e confessavam estas verdades, embora de modo elementar, ainda não formal. Em outras palavras – outro exemplo – os termos e sentenças dogmáticas que descrevem a Consubstanciação de Cristo ao Pai como “Homoousios” (uma só Substância) não foram explicitamente definidos pelos Apóstolos, mas o conceito por trás da verdade objetiva lhes foi dado “de uma vez por todas” por Cristo, ainda que esses conteúdos talvez não fossem possuídos conscientemente por eles, ao menos no formato dogmático com que o Concílio de Niceia os professou.

    Assim, o desenvolvimento da Doutrina acontece pelo conhecimento cada vez mais claro de certos pontos da Revelação, que entretanto sempre foram os mesmos e sempre afirmaram a mesma verdade objetivamente, seja no século I ou no século XXI. Todavia é fundamental entender que o aperfeiçoamento de nossa compreensão da Doutrina não, pode, de modo algum e em nenhum tempo, nos levar à contradição com o que já foi dito e definido: assim, nenhum Papa pode contrariar o que outro tenha ensinado sobre a moral e a doutrina. Se a Igreja definiu que só há uma religião verdadeira e que fora desta ninguém se salva, ninguém, nem a máxima autoridade eclesiástica, poderá ensinar o contrário, e se o fizer, é anátema, quer dizer ex-communio, fora da comunidade dos cristãos, está excomungado, não faz mais parte do Corpo Místico que é a Igreja. Plenamente conscientes dessa realidade, os Apóstolos, inspirados pelo Espírito Santo, advertiram-nos solenemente nas páginas das Sagradas Escrituras:

Ainda que nós mesmos [ainda que seja uma máxima autoridade da própria Igreja, portanto] ou um Anjo do Céu [nenhuma revelação particular, ainda que acompanhada por grandes prodígios e aparentes milagres] vos ensine um evangelho diferente do que já pregamos, seja anátema. (Gl 1,8)


    Uma analogia válida para essa questão, embora imperfeita, é a dos estudos da ciência oceanográfica: a civilização humana conhece há muitas gerações, por exemplo, o Oceano Atlântico. Ainda assim, o nosso conhecimento do Oceano Atlântico têm aumentado desde que nossos ancestrais descobriram que ele simplesmente existia. O conhecimento gradual do que é o Oceano Atlântico – sua temperatura, movimento, topografia, fauna e f.lora, etc. –, mas isso não modifica a realidade imutável do próprio Oceano, que permanece o mesmo de sempre, como já era desde o começo. Nosso conhecimento subjetivo do Oceano Atlântico é que sofre crescimento. Nossa percepção do Oceano Atlântico, entretanto, mesmo que cresça, nunca poderá nos levar a afirmar que não é oceano, e sim uma montanha.

    Partindo dessa analogia, vemos a Revelação como é objetivamente. Foi-nos dada de uma vez por todas e é imutável: é o que é. Ainda assim, rezando, meditando, contemplando, estudando e a vivenciando honestamente, vão-se percebendo certas facetas deste precioso diamante, que antes não havíamos notado. Esse crescimento em conhecimento nada adiciona à Revelação no sentido objetivo, mas demonstra que a nossa compreensão a seu respeito se desenvolve subjetivamente.



    A Revelação, imutável e definitiva, é transmitida pela Igreja sob a forma da Tradição: a Sã Doutrina cristã e católica está expressa e resumida no Credo e também nos documentos da Igreja, que ao longo da história cresceu na fé e produziu a Teologia. Dessa maneira foram criadas diversas formas de comunicação dessa compreensão da Revelação, destinadas a toda a Igreja (clero e leigos). Assim é que surgiram os documentos, as diretrizes e as normas baseadas na experiência e na observância da prática cristã e da Doutrina da Igreja. Logo, tudo que até hoje foi publicado válida e oficialmente pela Igreja (documentos) têm grande importância para a compreensão da autêntica Fé cristã.

    Se o Magistério da Igreja extrai da Revelação Divina todo o ensinamento que dá aos fiéis – que se compõe da Tradição oral que veio dos Apóstolos e da Tradição escrita, e se é sobre essa Tradição (escrita e oral, com igual importância nas duas formas), que o Magistério assenta seus ensinamentos infalíveis –, podemos dizer que sim, os documentos da Igreja são tão verdadeiros quanto a Sagrada Escritura. E como sabemos, sem a Revelação oral, que chegou até nós por meio da Sagrada Tradição, a Bíblia não existiria, já que ela foi redigida, canonizada e preservada pela mesma Igreja através dos séculos. As Sagradas Escrituras, portanto, são a Sagrada Tradição da Igreja por escrito.




Documentos oficiais da Igreja, tipos e classificação

Muitos se preocupam em saber qual o peso, a autoridade e/ou a importância de cada tipo de documento da Igreja e, nesses tempos de crise, isso se dá especialmente porque desejam saber se lhe devem obediência obrigatória ou não... Qual a autoridade e qual a hierarquia dos documentos pontifícios? Resposta: todos os pronunciamentos do Papa exigem respeito e obediência. Todos os seus documentos são importantes, porém, no geral, uma Bula tem mais peso que uma Encíclica. Todavia, para uma mesma definição o Papa pode usar documentos diferentes; por exemplo, Pio IX definiu o dogma da Imaculada Conceição com a Bula Ineffabilis Deus em 1854, enquanto que Pio XII definiu o dogma da Assunção de Maria pela Carta Apostólica Munificentissimus Deus em 1950. 

    Para resumir essa questão complicada, dizemos que não é preciso que o leigo comum se preocupe tanto com isso, porque basta saber que os documentos que obrigam a obediência precisam ser claros nesse sentido, conforme já explicamos em nosso estudo especial sobre a infalibilidade do Papa (acesse aqui).

    Se um documento é oficial, geralmente aparece na Acta Apostolicae Sedis. Abaixo, a classificação dos documentos pontifícios.

Carta Encíclica:

a) doutrinal,

b) exortatória,

c) disciplinar;

Epístola Encíclica;

Constituição Apostólica e Dogmática;

Exortação Apostólica;

Carta Apostólica;

Bula;

Motu Proprio.
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O exemplo de Santa Gianna Molla


GIANNA BERETTA Molla era filha de Alberto Bereta e Maria de Micheli, ambos da Ordem 3ª Franciscana. O casal tinha onze filhos quando ela nasceu, em Magenta (Milão, Itália), a 4 de outubro de 1922, dia de São Francisco.

A 4 de abril de 1928, com cinco anos, ela fez a Primeira Comunhão. Desde esse dia, mesmo muito pequena, todos os dias acompanhava sua mãe à Santa Missa. Foi crismada dois anos depois, na Catedral de Bérgamo. Durante os anos de estudos e na universidade, enquanto se dedicava aos deveres, praticava a sua fé participando da Ação Católica e na caridade para com os idosos e necessitados, na Conferência de São Vicente de Paulo. Formou-se com louvor em medicina e cirurgia em 1949, e em 1950 abriu seu consultório médico. Entre seus clientes, demonstrava especial cuidado para com as mães, crianças, idosos e pobres.

Especializou-se em pediatria na Universidade de Milão em 1952, mas frequentou a Clínica Obstétrica Mangiagalli: por seu grande amor às crianças e às mães, pretendia unir-se ao seu irmão, Pe. Alberto, médico e missionário no Brasil. Ele, com a ajuda de seu outro irmão engenheiro, Francesco, construíram um hospital na cidade de Grajaú, Estado do Maranhão. Gianna, por sua saúde frágil, foi desaconselhada de ir ao Brasil.

Gianna era uma ardorosa defensora da vida, sobretudo das crianças, nascituras ou já nascidas. Dizia: “O direito à vida da criança é igual ao direito à vida da mãe! O médico não pode decidir. É um pecado matar no seio materno!”...

A quarta e quinta gravidez de Gianna terminaram em aborto espontâneo no segundo mês, sem explicação aparente. Em 1961, ela se viu grávida pela sexta vez. Como médica, sabia muito bem as complicações e os riscos da nova gravidez. Mas isso de modo algum diminuiu o amor pelo novo filho, amado e desejado como os outros.

Mas um enorme tumor tomara conta de seu útero. Seria necessário extirpá-lo. A cirurgia proposta para o caso era a histerectomia, ou seja, a remoção do útero. O objetivo não era matar a criança, mas retirar o órgão canceroso, onde, por acaso, estava a criança. A cirurgia seria necessária mesmo que Gianna não estivesse grávida, e a morte da criança seria um segundo efeito da cirurgia. Fazer a operação, neste caso, não seria um pecado. Mas Gianna, livre e heroicamente, recusou-se. Dizia ela: “A mãe dá a vida pelo filho!”.

Depois de grandes sofrimentos, no dia 21 de abril de 1962, o cirurgião fez uma cesariana e retirou do ventre de Gianna uma linda criança de quatro quilos e meio: uma menina! Seu pai lhe daria no Batismo o nome de Gianna Emanuela. “Gianna” em homenagem à mãe; “Emanuela” que quer dizer “Deus conosco”, para louvar a Presença de Deus entre os homens. Gianna tanto desejara aquela criança... Mas agora tinha que deixá-la. Essa grande mãe sabia que não poderia desfrutar da presença de Emanuela. Revelou Gianna a sua irmã missionária, que acabara de chegar da longínqua Índia, Ir. Madre Virgínia: “Finalmente estás aqui! Se soubesses, Ginia, quanto se sofre por ter de morrer quando se deixam os meninos todos pequeninos...”.

Em 25 de abril, Gianna fez a seguinte confidência a seu esposo: “Agora estou curada. Pietro, eu estava já no Além, e se soubesses o que eu vi... Um dia te direi. Mas como éramos demasiado felizes, estávamos muito bem, com nossos meninos maravilhosos, cheios de saúde e de graça e com todas as bênçãos do Céu, mandaram-me cá para baixo, para sofrer ainda, porque não é justo apresentarmo-nos ao Senhor sem sofrimentos”.

Disse Pietro depois: “Desde aquele momento, estou certo, Gianna nunca cessou, nos seus sofrimentos, nas suas agonias, a sua Comunhão com o Senhor e a sua comunicação com o Céu. Ela já não desejava que eu a acariciasse e beijasse: já pertencia ao Céu”.


Gianna com sua filha Gianna Emmanuela

Morreu Gianna no dia 28 de abril de 1962, uma semana depois de dar à luz sua última filha. Em 1972 foi iniciada a causa de sua beatificação. Em 1992, o Bem-aventurado Papa João Paulo II reconheceu um milagre acontecido com a brasileira Lúcia Silva Cirilo (Maranhão) por intercessão de Gianna. Em 24 de abril de 1994, o Papa declarou Gianna bem-aventurada. No dia 4 de outubro de 1997, no II Encontro Mundial do Papa com as famílias, Gianna Emmanuela Molla (foto abaixo), que hoje é médica como a mãe, estava no Rio de Janeiro, no estádio do Maracanã, na presença do Santo Padre e de 200.000 pessoas. Elevou uma oração à sua bem-aventurada mãe, agradecendo por ter-lhe dado a vida duas vezes: pela geração e pelo martírio. Um momento emocionante e inesquecível.

Santa Gianna Molla foi canonizada em 16 de Maio de 2004.

Gianna Emanuela em 1997, ao lado de Fr. Thomas Rosica

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Fonte bibliográfica:

ESTAÚN, Pedro. Personajes y virtudes, Madri: Ediciones Rialp, 2011, pp. 41-48;
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Apelo em defesa da Sagrada Eucaristia


TEMOS VISTO visto multiplicarem-se os relatos de pessoas que comparecem à Missa, colocam-se na fila da Comunhão e, ao invés de receber a Eucaristia, pegam a Hóstia Consagrada e a guardam na bolsa ou no bolso, retirando-se em seguida. Possivelmente levam-nas para usar em rituais de quimbanda, cultos satânicos ou de magia negra. Segundo depoimento do Pe. Paulo Ricardo de Azevedo Jr. (Arquidiocese de Cuiabá), chegam a profanar a Hóstia Sagrada até em sessões de sexo grupal de rituais satânicos, conforme o referido sacerdote ouviu de uma jovem em confissão!

Pedimos a todos os nossos irmãos católicos que, ao verem alguém furtando hóstias na hora da Santa Missa, impeçam essa pessoa! Com tanto respeito e delicadeza quanto for possível, mas com firmeza, vamos impedir que o Corpo de Nosso Senhor, que se entregou em Sacrifício e sofreu as piores dores e angústias pela nossa salvação, seja corrompido e desrespeitado dessa maneira! Quem vir acontecer tal crime horrendo, tome uma atitude! Não finjamos que não vemos, como tem acontecido! Chega dessa história de católicos passivos e “mornos”. Vamos à luta, porque é preciso!


Está acontecendo no mundo:

• Ato satânico contra Eucaristia teve jovens como autores

• Roubam hóstias consagradas em igreja católica nos Andes do Peru

• França: mais uma igreja profanada

• Blasfêmia na internet

• Missa de desagravo após sacrilégio no qual pisaram e jogaram cerveja sobre a Eucaristia

A infalibilidade papal: o Papa é infalível? Quando? Como?

A DOUTRINA DA INFALIBILIDADE do Papa foi definida no 4º capítulo da 4ª sessão do Concílio Vaticano I (1869-1870), durante o pontificado de Pio IX. É comum ouvirmos, porém, muitos questionamentos a esse respeito, de pessoas que pensam que os católicos acreditam que o Papa seja infalível no sentido de impecável, como se fosse um homem acima do bem e do mal, isento de qualquer erro ou pecado, incapaz de fazer ou dizer qualquer coisa incorreta.

    O Sumo Pontífice da Igreja, claro, é humanamente imperfeito. Se alguns polemizam a respeito dessa questão, será por desconhecimento da Doutrina. No caso dos protestantes, que muito o questionam, é inegável que existe má vontade para aprender e entender. Por se tratar de um tema importante, no entanto, é necessário que os católicos compreendam definitivamente este assunto, para que possam também elucidar a outros quando tiverem a oportunidade.

    Em primeiro lugar, a doutrina da infalibilidade não diz que o Papa é um homem perfeito, que nunca erra ou que não pode pecar, por ser o Papa. O que a doutrina da infalibilidade papal afirma é que o Papa é infalível quando ensina a toda a Igreja em matéria de fé e de moral, nas condições "Ex Cathedra".

    O que significa isto? Ex Cathedra (do latim) significa, literalmente, "da Cadeira" ou "da Cátedra", quer dizer, quando ele fala como catedrático, isto é, como o maior Doutor que nos deu a Providência naquelas matérias mais importantes para a salvação das nossas almas. Quer dizer que o Papa é infalível quando se pronuncia a partir do Trono de São Pedro, aquele que recebeu as Chaves do Reino dos Céus, de quem ele é o legítimo sucessor, isto é, como o Sumo Pontífice, líder e condutor terreno de toda a Igreja, mas isso se dá especialmente nas seguintes condições:

        1) Quando se pronuncia como sucessor de Pedro, usando o poder das Chaves concedidas ao Apóstolo pelo próprio Cristo Jesus (Mt 16,19);

        2) Quando o objeto do seu ensinamento é a moral, fé e/ou os costumes;

        3) Quando ensina à Igreja inteira;

        4) Quando é manifesta a intenção de dar decisão definitiva (dogmática), condenando que se ensine tese oposta.


    Resumindo, o Papa é infalível quando se dirige, na qualidade de Sucessor de São Pedro Apóstolo, que ele propriamente é, a toda a Igreja; quando o objeto do seu pronunciamento é a moral, a fé e/ou os costumes; e quando define uma decisão a partir desta sua autoridade.

    Fora das condições descritas acima, o Papa é passível de falhas. Fica esclarecido, portanto, que nós, católicos, não cremos que o Papa é uma espécie de ser humano perfeito, que nunca erra e nem pode pecar. É importante notar também que mesmo fora dessas condições específicas o Papa não pode ensinar o erro a toda a Igreja, expondo ao risco as almas dos fiéis a ele confiadas: pode falhar como doutor privado, mas nunca como o Papa: esta é a chamada infalibilidade passiva, e é um assunto complexo, para o qual recomendamos a leitura atenta do documento pelo qual Pio IX definiu o dogma da infalibilidade (que pode ser acessado e lido na íntegra neste link) e, entre outras coisas, define (formal e infalivelmente) o seguinte:

...o Espírito Santo não foi prometido aos sucessores de S. Pedro para que estes, sob a revelação do mesmo, pregassem uma nova doutrina, mas para que, com a sua assistência, conservassem santamente e expusessem fielmente o Depósito da Fé, ou seja, a Revelação herdada dos Apóstolos. E esta doutrina dos Apóstolos abraçaram-na todos os veneráveis Santos Padres, veneraram-na e seguiram-na todos os santos doutores ortodoxos, firmemente convencidos de que esta Cátedra de S. Pedro sempre permaneceu imune de todo o erro, segundo a promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo feita ao príncipe dos Apóstolos: 'Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos'.[1] 

    Mesmo assim, alguns continuam achando absurdo pensar que o Papa é infalível quando instrui a Igreja a respeito de doutrina. O que você, leitor, pensa disso?

    Se somos mesmo cristãos, isso não é nenhum absurdo: na verdade, pelo contrário, crer na infalibilidade papal é, mais do que uma obrigação, uma conclusão natural e instantânea de todo o edifício da fé cristã. Para quem tem essa fé genuinamente cristã, o absurdo seria pensar que o Papa, Sucessor de Pedro e Pastor maior da Igreja, aquele que comanda toda a imensa nação de fiéis que constituem o Corpo Místico do Cristo no mundo, fosse falho enquanto líder, pois nesse caso ele seria totalmente incapaz de assumir a missão de conduzir a Igreja.

    Se o líder máximo da Cristandade não fosse infalível enquanto condutor da Igreja, não poderíamos crer em Igreja, nem nos Evangelhos, nem mesmo em Jesus Cristo, que pessoalmente entregou ao primeiro Sumo Pontífice as Chaves do Reino, e prometeu que estaria com a sua Igreja até o fim do mundo. – A infalibilidade é lógica, autoevidente e consta explicitamente nas Sagradas Escrituras:

Ide, pois, e ensinai a todas as nações; batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo. (Jesus Cristo à sua Igreja, no Evangelho segundo S. Mateus  - 28,19-20)

    Atenção: nosso Senhor afirma aos Apóstolos que estará com a Igreja até o fim do mundo. O mundo ainda não acabou, e a Igreja continua. Logo, isto demonstra que não só os Apóstolos, mas também os seus sucessores, escolhidos por eles próprios (como vemos no livro de Atos), estão ainda hoje conduzindo a humanidade sob a Assistência do Espírito Santo e de Nosso Senhor Jesus Cristo, que também garantiu a infalibilidade da doutrina dos Apóstolos:

Eu vos mandarei o Prometido de meu Pai; permanecei até que sejais revestidos da Força do Alto. (Lc 24,49)

O Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu Nome, ensinar-vos-á todas as coisas e vos recordará tudo que vos tenho dito. (...) O Espírito da Verdade o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece, mas vós o conheceis, porque permanecerá convosco e estará em vós. (Jo 14,26.17)

    Note-se a afirmação: "O Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece...". Jesus diz que cabe aos Apóstolos ensinar a doutrina verdadeira e autenticamente inspirada por Deus, que eles serão constantemente iluminados pelo Espírito Santo para esse fim. – Fica claro que não basta cada um ler a Bíblia, é preciso seguir a orientação da Igreja, que por sua vez é guiada pelo Papa, sob a Luz do Santo Espírito.

    Jesus Cristo enviou seus Apóstolos para propagar a toda a humanidade o Caminho que leva até o Pai do Céu. Portanto, se cremos em Jesus Cristo e nos Evangelhos, temos que crer também que os Apóstolos são infalíveis em seus ensinamentos, já que Cristo estará com eles até o fim do mundo, para que cumpram a missão de levar o Evangelho "até os confins do mundo": "Descerá sobre vós o Espírito Santo, e vos dará o poder; e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia, Samaria e até os confins do mundo" (At 1,8).

    "O que ligares na Terra será ligado nos Céus, e o que desligares na Terra será desligado nos Céus": a própria entrega das Chaves do Reino dos Céus a Pedro, com a promessa de que o Inferno não prevaleceria sobre a Igreja, juntamente com o poder dado a ele, Pedro, de ligar e desligar na Terra e no Céu (Mt 16,18-19), é a afirmação clara, direta e insofismável da infalibilidade daquele que comanda a Igreja. Se Nosso Senhor disse aos Apóstolos que deveriam ensinar o Evangelho à humanidade, e prometeu que estaria sempre com eles, até o fim do mundo, então, pela Providência Divina, esta Igreja não pode ensinar o erro, mas somente a verdadeira Doutrina, o Caminho certo até o Céu.

    A (re)confirmação definitiva consta no Evangelho segundo Lucas, quando o Senhor Jesus Cristo fala a Simão Pedro:

Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo; mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça; e tu, por sua vez, confirma os teus irmãos. (Lc 22,31)

    Mais tarde, o próprio Apóstolo Pedro confirmou esta mesma verdade, quando disse, no meio de todos os Apóstolos e presbíteros da Igreja reunidos, no Concílio de Jerusalém: "Irmãos, sabeis que há muito tempo Deus me escolheu dentre vós, para que da minha boca os pagãos ouvissem a Palavra do Evangelho e cressem." (At 15,7).

    Não. Não há dúvida nenhuma quanto à autoridade e infalibilidade da Igreja de Jesus Cristo enquanto "Casa do Deus Vivo" e "Coluna e Fundamento da Verdade" (1Tm 3,15) para os cristãos, e nem do Apóstolo Pedro e de seus sucessores.

    Como a criatividade humana não tem limites, porém, os inimigos da Igreja nunca deixam de tentar contestar até mesmo as verdades mais simples. Desesperados em sua tentativa de negar o óbvio, apelam para todo tipo de insanidade: já ouvimos dizer até que Pedro teria perdido a sua autoridade ao ter negado Nosso Senhor por três vezes... Que grande tolice, pois o Senhor voltou a confirmar a autoridade de Pedro quando lhe confiou a tarefa de apascentar o seu rebanho (a Igreja) depois disso, já ressuscitado (Jo 21,14-17). O mais curioso é que aqueles que inventam esses desvarios são os mesmos que se colocam como supostos entendedores das Sagradas Escrituras.

    Jesus Cristo é Deus, sabe tudo. Por certo sabia das contestações que surgiriam, no correr da história, a respeito da autoridade e da infalibilidade do Papa. Por isso, fez questão de repetir por três vezes que estava entregando a Ele, Pedro, a missão de apascentar seus cordeiros e suas ovelhas, isto é, a Igreja neste mundo.


Resumo e considerações finais

Não, o Papa não é infalível enquanto homem. Trata-se de um ser humano que dedicou e consagrou toda a sua vida ao serviço de Deus e da Igreja, e que foi eleito para ser o seu Cabeça visível. Mesmo assim, isso não significa necessariamente ser santo, pois, como visto, até mesmo S. Pedro, que conviveu diretamente com o Senhor e foi por Ele instituído, era falho: mesmo após a Ascensão do Senhor, Pedro, que sempre manteve o seu livre arbítrio, parece ter se equivocado em certos momentos, em determinadas questões práticas ou disciplinares, sendo repreendido por Paulo, outro Pilar da Igreja e grande Apóstolo. Mas essas dificuldades humanas não se refletiram nas suas instruções dogmáticas e doutrinais à Igreja, como por exemplo no caso da abolição da circuncisão (At 15,1-12). 

Sim, o Papa é infalível em suas funções como autoridade instituída diretamente por Nosso Senhor Jesus Cristo. A ele foram concedidas as Chaves do Reino de Deus, para instruir o Povo de Deus neste mundo, à frente da santa Igreja. A única ocasião em que Deus interfere no livre-arbítrio dos Apóstolos é quando estes cumprem a missão de doutrinar as "ovelhas" de Deus, pois os seres humanos não têm condições de comunicar Deus através da sua própria ciência ou por seus próprios méritos. Assim, o fiel comum não é capaz, através de elucubrações, estudos e debates com outras pessoas, de definir um ensinamento isento de erro; mesmo os grandes teólogos não possuem essa capacidade: suas conclusões somente são aceitas quando colocadas sob a apreciação do Magistério da santa Igreja, centrada na figura do Papa.

Observação importante: Hoje, nestes nossos dias confusos, a mais elementar honestidade nos impede de negar, em reta consciência diante de Deus, que o atual "Papa Francisco" já tenha caído em heresia, mais de uma vez, e que ele vem ensinando o erro à toda a Igreja, além de agir pertinazmente contra a moral e os costumes autenticamente católicos. Diante do fato, alguns tentam argumentar que isso é possível por ele não ter se manifestado Ex Cathedra ao cometer tais crimes (é a posição de Dom Athanasius Schneider, bispo do Cazaquistão, autor e respeitado teólogo). Outros discordam, dizendo que tal situação nos obriga a questionar a validade ou a legitimidade deste papado (é a posição de Dom Carlo Maria Viganò, Arcebispo e ex-Núncio Apostólico dos EUA, um eminente teólogo); mais além, temos a posição dos sedevacantistas, que geralmente questionam a legitimidade de todos os papas que vieram depois do desastroso concílio Vaticano II e suas novidades heréticas.

    De fato, o Magistério da Igreja já definiu e decretou — tanto pelo seu ensino constante quanto dogmaticamente —, que todo católico deve obedecer ao Papa como o condutor infalível da Igreja e sujeitar-se a ele, não somente quando decreta solenemente algum dogma (ex cathedra), mas também pelo seu Magistério ordinário. Dois exemplos concretos reproduzimos abaixo (destaques nossos):

"Não podemos passar em silêncio a audácia de quem, não podendo tolerar os princípios da Sã Doutrina, pretendem que aos juízos e decretos da Sé Apostólica que têm por objeto o bem geral da Igreja, seus direitos e sua disciplina, PODE-SE NEGAR ASSENTIMENTO E OBEDIÊNCIA DESDE QUE NÃO TOQUEM OS DOGMAS da fé e dos costumes, sem pecado e sem nenhuma violação da fé católica. ESTA PRETENSÃO É TÃO CONTRÁRIA AO DOGMA CATÓLICO DO PLENO PODER DIVINAMENTE DADO PELO PRÓPRIO CRISTO NOSSO SENHOR AO ROMANO PONTÍFICE PARA APASCENTAR, REGER E GOVERNAR A IGREJA, que não há quem não o veja e entenda, clara e abertamente. (...) Portanto, todas e cada uma das perversas opiniões e doutrinas determinadamente especificadas nesta Carta, com Nossa autoridade apostólica as reprovamos, proscrevemos e condenamos; e queremos e mandamos que todas elas sejam tidas pelos filhos da Igreja como reprovadas, proscritas e condenadas."
(Papa Pio IX, Quanta Cura, 8 dez 1864)
"Ensinamos, pois, e declaramos que a Igreja Romana, por disposição divina, tem o primado do poder ordinário sobre as outras Igrejas, e que este poder de jurisdição do Romano Pontífice, poder verdadeiramente episcopal, é imediato. E a ela devem-se sujeitar, por dever de subordinação hierárquica e verdadeira obediência, os pastores e os fiéis de qualquer rito e dignidade, tanto cada um em particular, como todos em conjunto, NÃO SÓ NAS COISAS REFERENTES À FÉ E AOS COSTUMES, MAS TAMBÉM NAS QUE SE REFEREM À DISCIPLINA E AO REGIME DA IGREJA, espalhada por todo o mundo, de tal forma que, guardada a unidade de comunhão e de fé com o Romano Pontífice, a Igreja de Cristo seja um só redil com um só pastor. Esta é a doutrina católica, da qual ninguém pode se desviar, sob pena de perder a fé e a salvação."
(Papa Pio IX, Constituição Dogmática Pastor Aeternus, n. 3060)

    O assunto é amplíssimo e complexo; não há como esgotá-lo, aqui. Mas é preciso dizer que nós estamos, assim, colocados diante de conclusões e posições teológicas distintas, e que compete a cada fiel católico decidir o que fazer, optar por uma delas ou simplesmente suspender o seu juízo até que tudo se esclareça: esta é a dificílima situação em que vivemos nestes dias, que muito possivelmente são aqueles profetizados como os da grande apostasia. Enquanto leigos, não nos cabe decidir por ninguém a respeito desse problema fundamental. Limitamo-nos a oferecer alguma luz que auxilie nossos irmãos, para aclarar suas dificuldade e os questionamentos que surgem, e o fizemos numa série especial que pode ser lida acessando-se este link. Rezamos continuamente pelo bem e pela salvação de todos os nossos leitores.


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[1] CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA PASTOR AETERNUS do Supremo Pontífice SS. PIO IX, de 18 de julho de 1870.
Arquivo Vaticano, PASTOR AETERNUS,disp. em:
https://vatican.va/archive/hist_councils/i-vatican-council/documents/vat-i_const_18700718_pastor-aeternus_it.html 
Acesso 10/1/2024.

U. Bellocchi (ed.),  Todas as Encíclicas e os principais documentos pontifícios emitidos desde 1740 , vol. IV: Pio IX (1846-1878), pp. 334-340, 1995, Libreria Editrice Vaticana, Cidade do Vaticano.

Constantino, Lutero e o Papa


UM LEITOR ANÔNIMO deixou-nos o seguinte comentário no post "A Igreja Católica foi fundada por Constantino?":


Boa tarde Henrique, voltei a este blog para contestar suas escritas...

Me explique por que a igreja catolica que se diz cristã parou de ser perseguida com o reinado de constantino? não foi pelo fato de que a igreja aceitou todo tipo de paganismo que constantino trouxe para dentro da igreja? paganismo este, que fez com que Martinho Lutero se rebelasse contra a igreja catolica,que na época e agora podemos chamar de igreja caótica?... graças a Deus que Martinho Lutero conheceu a biblia e teve coragem de enfrentar quem fosse para revelar a verdade escondida do povo, pela biblia e só pela biblia. Também elogio suas contestações de muitas igreja ditas cristãs, mas e a contestação ao papa, vc não faz??? de onde inventaram essa de que o papa é o sumo pontifice???

Prezado, anônimo, a Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo. Quer dizer então que você voltou? Mas, com todo o respeito, eu pergunto: quem é você? São muitos os que aparecem por aqui, apresentando sempre as mesmas argumentações, idênticas às suas, e nenhum deles se identifica. Enfim, seja você quem for, preciso dizer que desta vez você deve ter se superado! São tantos equívocos juntos, e tão absurdos, que nem sei por onde começar a responder! Comecemos, então, do começo, dividindo suas argumentações (ou acusações?) em partes, para facilitar a compreensão dos nossos leitores:

Me explique por que a igreja catolica que se diz cristã parou de ser perseguida com o reinado de constantino?

Em primeiríssimo lugar, não foi a "Igreja Católica" no sentido que você aplica, como se fosse "uma igreja entre muitas igrejas", que deixou de ser perseguida sob o governo de Constantino, – simplesmente porque não existiam muitas "igrejas" nesse tempo, mas apenas uma única Igreja: a Igreja una e indivisível de Cristo, instituída diretamente pelo Senhor Jesus e preservada na Tradição dos Apóstolos e dos seus sucessores, eleitos por eles mesmos.

Logo, foram os cristãos como um todo que deixaram de ser perseguidos; foi A Igreja do Senhor que passou a viver um novo período a partir dali. – Esta mesma Igreja que perseverou na fé dos Apóstolos por mais de mil e quinhentos anos antes de surgir o seu protestantismo, com a famigerada heresia da sola scriptura, que dividiu o povo de Deus. Não foi "uma certa 'igreja católica'" que ganhou direitos reconhecidos pelo Estado, como se alguma "outra igreja" tivesse conhecido um destino diferente. Só havia uma Igreja, a Igreja do Cristo, aquela edificada diretamente pelo Senhor sobre o Apóstolo Pedro, que é também a Igreja de sempre, pois foi junto a esta que o Senhor prometeu que estaria até o fim dos tempos (Mt 28,20). Procure entender isso antes de tudo.

De todo modo, a partir desta sua primeira pergunta já fica evidente, logo de início, que você não leu a postagem que está comentando. E como é que você pode ter opinião a respeito de um texto que não leu? Imagino que seja da mesma maneira que formou opinião a respeito da Igreja Católica sem conhecê-la: partindo da caricatura que o seu "pastor" pinta da Igreja. Pensando bem, vindo de um "evangélico", faz sentido.

O fato é que o próprio artigo que você está comentando explica a razão de terem cessado as perseguições à Igreja sob o governo de Constantino, que é mais do que óbvia: é que o imperador declarou a sua conversão ao cristianismo e publicou um édito suspendendo a perseguição. Simples. Veja bem que ele não suspendeu perseguição à "igreja X", "Y", ou "Z". A perseguição era contra os cristãos como um todo, contra o Corpo Uno, – Corpo de Cristo, – que sempre foi a Igreja. Eram perseguidos os que confessavam a fé em Jesus como Filho de Deus e Salvador do mundo.

Tudo isso é fato histórico, consta nos registros da História, assim como consta que o primeiro presidente do Brasil foi o Mal. Deodoro da Fonseca, por exemplo, ou que a primeira guerra mundial durou de 1914 até 1918. Se não fossem os registros históricos, nós não saberíamos muita coisa a respeito de nada, sabia? É para isso que serve o estudo da História: para que nós aprendamos as coisas. E é por isso que não podemos ler somente, – exclusivamente, – a Bíblia Sagrada. Aliás, se você lê só a Bíblia, única e exclusivamente, não pode saber quem foi Lutero, esse mesmo que você defende sem ter ideia de quem foi.

Diga-me sinceramente, por favor: que livro você leu sobre Lutero? Quais as suas fontes de pesquisa sobre ele? O que você sabe, com certeza, sobre a sua história, o seu ideário, seus modos, seus princípios? Veremos um pouco sobre este assunto mais adiante. Por ora, prossigamos com a continuação do seu comentário:

não foi pelo fato de que a igreja aceitou todo tipo de paganismo que constantino trouxe para dentro da igreja? paganismo este, que fez com que Martinho Lutero se rebelasse contra a igreja catolica,que na época e agora podemos chamar de igreja caótica?...

Bem, à sua pergunta-acusação eu poderia responder com uma só e curta palavra: não. Claro que Constantino não trouxe paganismo para dentro da Igreja, e nem ele nem ninguém teria como fazê-lo. Vou explicar porquê.

Você conhece o Credo Niceno? Se não conhece, pode ler aqui neste site protestante (faço questão de indicar uma fonte protestante para que você veja o quanto os chamados 'evangélicos' são incoerentes: um condena e outro defende a mesma coisa, sendo que o Reino de Deus não se divide contra Si mesmo). Muito bem; eu o desafio a encontrar, na declaração de fé do Credo Niceno, uma letra, – uma vírgula que seja, – que apresente algum vestígio de "paganismo". Eu o desafio a encontrar ali qualquer insinuação que contrarie a autêntica fé cristã de sempre. Se você for capaz de fazer isso, eu me convenço e encerro as atividades deste site!

Sim. O Credo é a perfeita confissão da fé cristã resumida. Agora, você sabe quem participou diretamente na elaboração desta oração-declaração? O próprio: o imperador Constantino, que na cabeça dos falsos profetas e teóricos da conspiração, – que você chama de “pastores”, – foi um “paganizador” do cristianismo original.


Fragmento de estátua representando o Imperador Constantino (séc. IV, Museus Capitolinos, Roma)

Esse fato, no entanto, só vale como ponto de referência, já que o mais importante é demonstrar o absurdo da teoria que você apresenta, e mais do que isso, a blasfêmia contra Cristo, aquele que você pensa que conhece e segue só lendo a Bíblia, e interpretando-a do seu jeito; contrariando o que diz a própria Escritura: "Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal” (2Pd 1,20).

Que blasfêmia você está dizendo? Ora, você está simplesmente declarando Nosso Senhor Jesus Cristo como um mentiroso! O que, por outro lado, não é de se estranhar, afinal foi isso que o seu herói Lutero fez, também. E Lutero é o seu salvador, conforme você mesmo disse! Não é bem isso? Então vejamos...

Você por certo concorda que a Igreja já existia antes de Constantino, certo? Se disser que não concorda com isso, então a Bíblia está toda errada, pois ela mostra o Senhor fundando sua Igreja, mostra os Apóstolos proclamando o Evangelho, trabalhando pelo crescimento da Igreja, etc, etc. Além disso, se você disser que a verdadeira Igreja de Jesus Cristo ainda não existia até o tempo de Constantino, o que você estaria afirmando é que nos primeiros três séculos após a Ressurreição de Jesus não existiam cristãos. E se não existisse Igreja até Constantino, quem é que os imperadores anteriores perseguiam, atiravam às feras, etc.? Então, até aqui, concordamos: a Igreja já existia antes de Constantino. Ponto.

Definido este ponto, precisamos então analisar o que você diz, literalmente: “a igreja aceitou todo tipo de paganismo...”. São suas palavras. Então, o que você diz é que a Igreja já existia, mas a partir do Imperador Constantino, quando os cristãos receberam a liberdade de culto no Império, ela se corrompeu. Você disse isso, e é nisso que protestantes/"evangélicos” acreditam. Eu sei muito bem, porque eu também já fui um de vocês e já estive perdido no mesmo erro. E é exatamente aí que está a blasfêmia contra Nosso Senhor: se a Igreja se corrompeu, então Jesus mentiu, pois Ele mesmo declarou categoricamente: “Sobre esta Pedra edifico a minha Igreja: os portais do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16,18). E o Senhor também declarou à sua Igreja: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20).

Se o Senhor Jesus Cristo garantiu que o Inferno nunca prevaleceria contra a Igreja, e prometeu que estaria com ela todos os dias, até o fim dos tempos, como é que você vem me dizer que essa mesma Igreja se corrompeu, se deixou paganizar por Constantino?!

E você ainda diz mais: “graças a Deus que Martinho Lutero conheceu a biblia e teve coragem de enfrentar quem fosse para revelar a verdade escondida do povo...” – Observe o tamanho da sua arrogância! “Martinho Lutero conheceu a Bíblia”?? Por piedade, anônimo, aprenda esta verdade essencial de uma vez por todas: se você tem a Bíblia para carregar debaixo do braço, hoje, é graças à Igreja Católica! Foi a Igreja Católica que produziu, canonizou e preservou os textos da Bíblia, através dos séculos até hoje. A Bíblia é filha da Igreja, e não a mãe da Igreja! – A Bíblia que você conhece só é o Livro Sagrado dos cristãos porque a Igreja assim o declarou! Nós não temos que ler a Bíblia para interpretar a Igreja, e sim aprender da Igreja, que, inspirada pelo Espírito Santo a produziu, como ler a Bíblia!

Mas, se você crê que a Igreja se corrompeu, – mesmo Jesus Cristo tendo prometido que isso não aconteceria jamais, – e que foi Martinho Lutero quem conheceu a Bíblia e "teve coragem" – palavras suas – "para revelar a verdade", então o seu Salvador não é Jesus, e sim Lutero!


Quem veio revelar a Verdade? Jesus Cristo ou Martinho Lutero, mil e quinhentos anos depois?


Também elogio suas contestações de muitas igreja ditas cristãs, mas e a contestação ao papa, vc não faz???

Claro que eu não contesto o Papa, enquanto tal! Ele é o sucessor de Pedro, o Apóstolo a quem o Senhor confiou sua Igreja na Terra! Não que nós, católicos, acreditemos que ele seja "infalível", no sentido de "impecável", como muitos de vocês, mentindo, 
gostam de dizer de nós, mas é sobre ele que repousa a autoridade terrena da Igreja, dada diretamente por Nosso Senhor. Por isso, o Cristo Vivo edificou sua Igreja sobre Pedro (Mt 16,18ss), e por isso mesmo perguntou a Pedro por três vezes se ele o amava, e por três vezes lhe confirmou que confiava, - diretamente a ele, - o trabalho de "apascentar o seu rebanho”, isto é, conduzir a sua Igreja neste mundo (Jo 21,15-17). Está tudo na Bíblia! Ou faltam algumas páginas na sua?

O Senhor concedeu a autoridade aos seus Apóstolos, para que eles dessem prosseguimento à sua Igreja, e isso eles fizeram e continuam fazendo até hoje, a despeito dos traidores, que desde Judas evidentemente sempre existiram. A Igreja precisa desse núcleo apostólico, chamado Magistério, para que não ocorra o que sempre ocorreu no protestantismo: divisões e divisões, e mais divisões. E depois, subdivisões e mais subdivisões, ad infinitum, sem fim. Sabe por quê? Porque quando não há Magistério nem Sucessão Apostólica, a casa literalmente cai, se autodestrói! Se cada um tem autoridade para crer como quiser, se cada um pode interpretar o Evangelho "do seu jeito" particular, vira bagunça. E aí retomo a passagem da Escritura que citei no começo: "Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação particular” (2Pd 1,20).

Trata-se de um fato muito, muito simples: se fosse para cada um ler a Bíblia, interpretar ao seu modo e sair por aí fundando "igrejas" e mais "igrejas", o Cristo não teria dado a autoridade sobre a Sã Doutrina aos Apóstolos. Logo depois de fundar a Igreja sobre Pedro, na mesma fala, Jesus diz a este mesmo Pedro que tudo o que ele ligasse na Terra seria ligado no Céu, e o que ele desligasse na Terra seria desligado no Céu (Mt 16,18). E ainda diz aos Apóstolos, em outra ocasião, que os pecados que eles perdoassem seriam perdoados, e os que eles não perdoassem seriam retidos (Jo 20,23)! Essa é a autoridade que a Igreja possui na Terra, dada pelo Senhor! Como pode haver alguma dúvida sobre isso, para alguém que diz que segue a Bíblia?


E você ainda me pergunta: "de onde inventaram" que o Papa é o sumo pontífice?

Sabendo que a palavra “pontífice”, designa a pessoa mais notável de uma comunidade, eu lhe respondo: faça essa pergunta para Jesus Cristo, pois foi Ele mesmo Quem "inventou" que Pedro seria o líder, o condutor da Igreja no mundo, isto é, o Pontífice!

A palavra "Pontífice" não está escrita, textualmente, na Bíblia, e nem o termo "Papa" é aplicado a Pedro, literalmente, mas as Escrituras deixam mais do que claro que o Senhor elevou Pedro como o primeiro Papa da família dos cristãos; – isto é, o primeiro pai da comunidade dos filhos de Deus. – E antes que você diga que chamar um líder espiritual de “pai” não é bíblico, leia lá em Isaías 22,21 o próprio Deus dizendo o contrário. Você crê na Bíblia como um todo ou só naquelas partes que confirmam o que ensina o seu "pastor"?

Nosso Salvador, à véspera de deixar este mundo, confiou a Pedro a guarda do seu rebanho, e é importante entender que, naquele momento, confiava-lhe o cuidado de toda a cristandade, fazendo questão de entregar a ele a guarda dos "cordeiros" e também das "ovelhas". “Apascenta os meus cordeiros”, repete o Senhor duas vezes; e à terceira, diz: “Apascenta as minhas ovelhas”. “Apascentar”, aí, significa cuidar, governar, guiar, assumir a responsabilidade do rebanho; neste caso, é receber do Divino Proprietário a autoridade sobre o seu Rebanho, que é a Igreja.

Apascentar os cordeiros e as ovelhas é, portanto, governar com autoridade a Igreja de Cristo; é ser o condutor; é ter o Primado. E como se não bastasse, além de tudo isso, todo o contexto do Novo Testamento demonstra que Pedro tinha a palavra final nos assuntos da Igreja primitiva, em diversas passagens.

É Pedro quem propõe a eleição de um discípulo para ocupar o lugar de Judas e completar o Colégio dos Doze (At 1,15-22);

É Pedro o primeiro que prega o Evangelho aos judeus no dia de Pentecostes (At 2,14; 3,16);

É Pedro que, inspirado por Deus, recebe na Igreja os primeiros gentios (At 10,1);

Pedro realiza visitas pastorais às primeiras comunidades da Igreja (At 9,32);

No Concílio de Jerusalém, temos a prova definitiva: é Pedro quem põe um fim à longa discussão que ali se travava, decidindo, ele, que não se deveria impor a circuncisão aos pagãos convertidos, e a Bíblia diz que todos os Apóstolos e anciãos da Igreja reunidos fizeram silêncio quando ele declarou: "Sabeis que o Senhor me escolheu dentre vós para que da minha boca os pagãos ouvissem o Evangelho...". E ninguém ousou opor-se à sua decisão (At 15,1-12).

E esta autoridade de Pedro, assim como a de todos os Apóstolos, era e continua sendo transmitida de um homem para outro, sendo eleitos os novos sucessores pelo próprio Colegiado dos Apóstolos, desde o início até o presente. Você pode escolher qualquer bispo católico de hoje e fazer a "contagem regressiva" a partir dele: este foi ordenado por este, que foi ordenado por aquele, que por sua vez foi por aquele outro... E no final você vai chegar nos Apóstolos e ao próprio Fundador da Igreja, Jesus Cristo, que os escolheu um a um, porque a Igreja Católica não foi "inventada" por um homem qualquer, que leu a Bíblia e se achou no direito de começar uma nova religião, uma "nova igreja", assim como ocorre com todas – atenção – todas as "igrejas" protestantes e "evangélicas". Sinto se o ofendo, mas é a verdade, e quem se ofende ao ouvir a verdade não pertence a ela, como diz o Senhor: "Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz (Jo 18,37).

No caso de Pedro, as Chaves do Reino dos Céus, entregues por Jesus Cristo, vêm sendo transmitidas, nesses dois mil anos de história, através do Papado. A autoridade de Pedro não morreu com ele, e dizer isso seria o mesmo que renegar a Promessa do próprio Senhor Jesus Cristo:

Ide e fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado. Eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Amém.
(Mt 28,20)

Se o Senhor prometeu que continuaria com a sua Igreja até o fim do mundo, também a autoridade que ele concedeu à sua Igreja permanece, até o fim dos tempos. Esta é a doutrina católica. Esta é a Palavra de Deus, segundo as Sagradas Escrituras. Esta é a Tradição cristã e católica, de dois mil anos de história. Quem pregar o contrário, seja anátema.

De fato, não existem 'dois evangelhos': existem apenas pessoas que semeiam a confusão e querem perturbar o Evangelho de Cristo. Mas ainda que alguém, nós ou um anjo baixado do céu, vos anunciasse um evangelho diferente do que vos temos anunciado, que seja anátema
(Gl 1,6-8)

Amém. Graças a Deus!
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7º Domingo do Tempo Comum, ano A, Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo S. Mateus (5,38-48)


“SEDE PERFEITOS como vosso Pai dos Céus é perfeito” (Mt 5,48). Esta frase do Evangelho é incômoda. Pode sem dúvida ser aplicada com um peso indevido. Sim, pois quem é perfeito nesta vida? E quantos, em busca de um ideal de perfeição, acabaram sucumbindo no meio do caminho ou ficaram paralisados diante de culpas ou de um sentimento de culpa demasiado? É interessante observar que esta fala de Jesus se dá depois de um longo discurso sobre o amor ao próximo. Isso indica que a perfeição exigida por Cristo não é uma exortação à impecabilidade absoluta, na vida ou no culto, ou de uma construção aparentemente impecável de pureza; nem tão pouco indica a necessidade de uma relação irretocável com Deus.

A nossa busca pela perfeição é um crescimento no Amor, que se concretiza por um novo modo de se relacionar com Deus e também com nossos irmãos. “Ao lermos as Escrituras, fica bem claro que a proposta do Evangelho não consiste só numa relação pessoal com Deus. E a nossa res­posta de amor também não deveria ser entendida como uma mera soma de pequenos gestos pes­soais a favor de alguns indivíduos necessitados, o que poderia constituir uma "caridade por re­ceita", uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar ou anestesiar a consciência. A proposta é o Reino de Deus (cf. Lc 4,43); trata-se de amar verdadeiramente e praticamente a Deus. Na medida em que Ele conseguir reinar entre nós, a vida social será um espaço de fraternidade, de justiça, de paz, de dignidade para todos” (Evangelii Gaudium §180). 

“Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem. Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos Céus, porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons e faz cair a chuva sobre justos e injustos” (Mt 5,44-45). As palavras de Jesus devem nos incomodar, tiranr-nos do comodismo, fazer-nos dar mais do que aquilo que é justo, mais do que se pode calcular pela lógica da retribuição humana. É preciso entrar na dinâmica da gratuidade, que tem a sua força na encarnação do Filho de Deus: Deus que se torna humano e ama os pecadores, não retribui mal com mal, mas dá a vida também pelos seus agressores. Ele faz chover sobre maus e bons, não ama apenas os santos. Jesus nos ensina a amar de modo gratuito, sem prestar atenção no limite do irmão, pois somos todos falhos, pequenos, participantes solidários do pecado.

Diante dos enfrentamentos humanos, o primeiro movimento costuma ser a vingança. Parece ser justo retribuir o mal com o mal, destruir o agressor. É preciso ter consciência dos movimentos de nosso coração, com a clareza de que somos capazes de agredir, vingar, bater e até matar. A consciência de que somos também agressores ajuda-nos a crescer no Amor. É preciso que se tenha clareza de que é muito fácil e espontâneo viver uma vida narcísica, egoísta. Disse a poetisa Cecília Meireles: “É difícil fazer alguém feliz, assim como é fácil fazer triste. É difícil dizer eu te amo, assim como é fácil não dizer nada. É difícil valorizar um amor, assim como é fácil perdê-lo para sempre”. 

Estamos diante da concupiscência humana, esta fraqueza que nos faz tender sempre para o mal. Precisamos lutar contra esse tendência todos os dias, a todo instante. Diante do movimento de ódio e ressentimento, Jesus nos dá o remédio da oração. Não é possível orar por alguém sem que haja algum movimento positivo no coração. Quando oramos por alguém, amamos esta pessoa em Deus. Por isso, este é o primeiro passo para destruir a corrente de vingança e ódio. Dar a outra face não significa uma atitude ingênua e talvez meio suicida, mas sim a capacidade de dar uma nova chance. Todos, inclusive nós, queremos sempre uma nova oportunidade de tentar ser bom, de reconstruir o que foi destruído. 

É preciso viver o amor genuíno: o santo Amor de Jesus. Viver na dinâmica do ódio e da vingança é paganismo. Assim, o Evangelho nos questiona sobre o sentido mais profundo de nossa religião. Somos realmente seguidores de Jesus? Que atitudes nossas vêm demonstrando sintonia com as exigências desta Palavra de Deus? Só pela fidelidade no Amor é que podemos nos considerar filhos do Pai Celeste.

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Adaptado da homilia do  Pe. Roberto Nentwig, para o 7º Domingo do Tempo Comum, ano A, disponível em:

http://catequeseebiblia.blogspot.com.br/2014/02/homilia-do-7-domingo-do-tempo-comum-ano.html
Acesso 22/2/014
ofielcatolico.blogspot.com
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