Leão XIV e a cruel revolução do Vaticano II


Traduzimos uma interessantíssima reflexão postada no noticioso "The Remnant" (Minesota, EUA) pelo colunista Robert Morrison: gostaríamos de ter as respostas para as suas perguntas.

EM SEU DISCURSO do Angelus de 27 de julho (2025), o Papa Leão XIV falou sobre a necessidade de nós, católicos “evitarmos a crueldade com o nosso próximo se quisermos poder chamar Deus de nosso Pai”, nos seguintes termos:

Quando recitamos o Pai-Nosso, além de celebrarmos a graça de sermos filhos de Deus, também expressamos nosso compromisso de corresponder a esse dom amando-nos uns aos outros como irmãos e irmãs em Cristo. Refletindo sobre isso, um dos Padres da Igreja escreveu: 'Devemos lembrar... e saber que, quando chamamos Deus de 'nosso Pai', devemos nos comportar como filhos de Deus' (São Cipriano de Cartago, De Dom. orat. , 11), e outro acrescenta: 'Não podeis chamar de Pai o Deus de toda a bondade se conservais um coração cruel e desumano; pois, nesse caso, não tendes mais em vós a marca da bondade do Pai celestial' (São João Crisóstomo, De orat. Dom. , 3). Não podemos rezar a Deus como 'Pai' e depois sermos rudes e insensíveis com os outros.'


    
Por mais que se trate de uma piedosa exortação, ficamos nos perguntando o que o novo pontífice pretende fazer para lidar com uma das crueldades mais perversas do mundo atual: os ataques contínuos do próprio Vaticano à pura Fé católica, e a sua perseguição às almas que nada mais desejam do que praticar a Religião com fidelidade. Parafraseando São João Crisóstomo, no Angelus, Leão XIV poderá chamar a Deus de Pai se mantiver o silêncio reinante nas últimas duras décadas sobre essas crueldades insondáveis?


    
A triste história do declínio da frequência à Missa após o Vaticano II é familiar a muitos que estudaram a crise na Igreja. As mudanças promovidas por Roma em prol da revolução do Vaticano II roubaram a fé de boa parte dos católicos, o que levou, como era previsível, ao esvaziamento dos bancos das igrejas.

    Para colocar a questão em perspectiva, podemos considerar as primeiras perguntas e respostas que eram feitas durante a cerimônia do Batismo:

    Padre: O que pedes à Igreja de Deus?
    R.: A Fé.

    Padre: O que a Fé te oferece?
    R.: Vida eterna.

    A Fé é o que as almas desejam da Igreja Católica, desde que Nosso Senhor a estabeleceu. No entanto, como acertadamente denunciou o Arcebispo Marcel Lefebvre em seu sermão de 1977 para as ordenações sacerdotais em Ecône, desde o Concílio Vaticano II, o próprio Vaticano vem afastando as almas da Fé.

Qual foi a primeira palavra que o padre nos disse quando éramos crianças e não podíamos falar por nós mesmos, e à qual nossos padrinhos responderam? "O que vocês pedem à Igreja de Deus?" Essa foi a pergunta que o padre fez aos nossos padrinhos: "O que vocês pedem à Igreja de Deus?" — "Nós pedimos fé", foi isso que nossos padrinhos responderam. E agora nós também pedimos à Igreja, ou àqueles que se dizem da Igreja, àqueles que ocupam cargos importantes na Igreja, àqueles responsáveis por essa fé, nós lhes pedimos: "Preservem a Fé para nós, deem-nos a Fé. Essa Fé Católica é o que queremos. Não queremos outra". "Por que vocês pedem Fé?", disse o padre aos nossos padrinhos. "Queremos a Fé porque nos leva à Vida Eterna". Por que estamos aqui na Terra, a não ser para ganhar a Vida Eterna? Não temos outro propósito aqui na Terra a não ser ganhar a Vida Eterna; a vida na Terra é uma vida passageira, uma vida efêmera – alguns dias, alguns anos, algumas décadas. Temos que escolher se queremos a Vida Eterna – Sim ou Não. Queremos a Vida Eterna, e para isso queremos a Fé Católica. Mas somos compelidos a afirmar que, há quinze ou vinte anos, aqueles com a mais alta autoridade na Igreja, a Santa Sé e o Vaticano, têm se afastado, têm nos afastando da Fé Católica, e se tornaram amigos dos nossos inimigos.


    
O Arcebispo Lefebvre estava certo na sua avaliação? Ele tinha razões para isso? Ou foi só um excomungado cujo nome nem deveria ser mencionado, como quer o pe. José Eduardo? O que o motivou? Desobediência ou o santo zelo pela Casa de Deus?

    Como uma indicação entre muitas, podemos considerar o estudo de 2025 do National Bureau of Economic Research (NBER) recentemente citado pelo Rorate Caeli:

Constatamos que as taxas de frequência aos serviços religiosos em países predominantemente católicos começaram a diminuir em relação às de todos os outros países precisamente após o concílio do Vaticano II. Esse resultado se aplica à frequência de adultos e crianças aos serviços religiosos e também se aplica quando se utiliza a proporção de adeptos católicos de um país. No geral, a taxa de frequência relativa de católicos caiu quatro pontos percentuais por década entre 1965 e 2015. Esse padrão é consistente (...) com a visão de que o Vaticano II desfez a percepção da Igreja como imutável e defensora da verdade (Greeley [2004], MacCulloch [2010]). De forma mais geral, esses resultados podem explicar por que muitas autoridades religiosas relutam em modernizar sua doutrina ou reduzir as barreiras à participação religiosa.


    Outro flagelo que se alinha com a afirmação do Arcebispo Lefebvre é o fato de que muitas verdades elementares da Fé Católica não são mais aceitas por muitos daqueles que se identificam como católicos(!). Considere, por exemplo, que muitos bispos, padres e leigos parecem rejeitar uma ou mais das seguintes verdades infalíveis (De fide), entre outras, dos Fundamentos do Dogma Católico:

    “Os Sacramentos da Nova Aliança são necessários para a salvação da humanidade.”

    
“O Corpo e o Sangue de Jesus Cristo estão verdadeira, real e substancialmente presentes na Eucaristia.”

    
“As almas que partem desta vida em estado de pecado original são excluídas da Visão Beatífica.”

    
“Sem o auxílio especial de Deus, os justificados não podem perseverar até o fim na justificação.”

    
“Deus concede a todos a graça suficiente para a observância dos Mandamentos Divinos.”

    
“A vontade humana permanece livre sob a influência da graça eficaz, que não é irresistível.”

    
“Há uma graça que é verdadeiramente suficiente e ainda assim permanece ineficaz.”

    
“A justificação de um adulto não é possível sem a Fé.”

    
“Sem uma Revelação Divina especial, ninguém pode saber com a certeza da fé se está em estado de graça.”

    
“A graça pela qual somos justificados pode ser perdida, e é perdida por todo pecado grave.”

    
“A filiação à Igreja é necessária para todos os homens para a salvação.”

    A maioria dessas verdades tem sido, implícita ou explicitamente, contrariada pelos princípios do falso ecumenismo e da liberdade religiosa que prosperaram desde o Concílio. E não só por leigos ou padres  desorientados, mas muitas e repetidas vezes pelos próprios "papas conciliares".

    
Longe de tentar retificar as crenças errôneas que prevalecem entre muitos "católicos nominais" (os que se declaram católicos mas não praticam a Religião), Roma tem continuamente favorecido esses males, fechando os olhos para heresias e perseguindo os católicos tradicionais que aderem àquilo que a Igreja sempre ensinou(!). Sim, é uma verdade inconveniente, mas ainda a afirmação dos fatos, que a avaliação do Arcebispo Lefebvre, em 1977, estava inteiramente correta: "...aqueles com a mais alta autoridade na Igreja, a Santa Sé e o Vaticano, têm se afastado, afastando-nos da Fé católica, e se tornaram amigos de nossos inimigos".

    
Durante décadas, os católicos tradicionais pediram à Igreja somente a defesa da Fé pura, verdadeira, a Fé "de sempre". Em resposta, o Vaticano efetivamente se tornou "o pai mau" descrito por Nosso Senhor no Sermão da Montanha.

    
Apenas para fins de argumentação, permitamo-nos supor, por um instante, o completo absurdo de que a revolução do Vaticano II estivesse correta ao promover a falsa noção de ecumenismo e de liberdade religiosa que prospera até hoje. Como sabemos, os progressistas em Roma têm usado o falso ecumenismo e a liberdade religiosa para louvar, defender e até mesmo promover todas as denominações ditas cristãs que a Igreja já havia anatematizado e condenado como heréticas  — sejam batistas, episcopais, luteranos, metodistas, etc. Todos têm um lugar de honra nas assembleias ecumênicas patrocinadas pelo Vaticano desde a década de 1960. Como é possível, então, que os únicos cristãos desonrados e perseguidos pelo Vaticano, os únicos que não encontram espaço em lugar algum dentro dessa nova estrutura, sejam os católicos tradicionais, que se submetem aos maiores sacrifícios para observar o que a Igreja sempre ensinou? 

    A expressão "desorientação diabólica" parece uma resposta totalmente precisa.

“Qual dentre vós é o homem que, se o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, se lhe pedir peixe, lhe dará uma serpente?” (Mt 7,9-10)

    Veja o leitor que, quando falamos de "tradicionalistas", não estamos nos referindo a um grupo majoritário, que estivesse ameaçando o espaço ou as supostas "conquistas" da dita "igreja conciliar". Não! Por exemplo, na maioria das pouquíssimas paróquias onde se celebrava a Missa tridentina segundo o Motu Próprio de Bento XVI, o que havia era um horário totalmente alternativo, uma celebração à parte, geralmente frequentada por grupos pequenos, embora muito leais. Mas isso incomoda profundamente os filhos da revolução, que nem isso podem admitir. Eles não podem tolerar que haja nenhum mínimo resquício da Tradição em canto algum. Eles precisam dominar e reinar sobre absolutamente tudo. Se há mil padres vestidos como playboys, e no meio deles apenas um que insista em usar a batina, este único será não só rejeitado e excluído, mas também perseguido.

    Eles aceitam e de fato incentivam absolutamente qualquer coisa na Igreja, desde padres que frequentem terreiros de umbanda até aqueles que promovem uma aberração chamada "missa da maconha" e os que pregam que "o homossexualismo é um dom de Deus", como disse numa pregação, há alguns anos, 
o então bispo de Caicó (atualmente de Petrolina), Dom Antônio Carlos Cruz. Mas se houver algum padre que ouse repetir aquilo que disseram os Santos, este não será acolhido, não terá espaço, não receberá misericórdia alguma. Será perseguido, punido, afastado sem piedade.


    
Leão XIV herdou este regime vaticano que cruelmente oferece pedras a quem pede pão e atira serpentes a quem pede peixe. Desde Paulo VI, a cada vez que acontece a eleição de um novo Papa, o grupo cada vez menor dos fiéis católicos que têm zelo pela Sã Doutrina têm rezado esperançosamente pela vinda de um pontífice que restaure as coisas santas, que recupere o que foi perdido, que pare a destruição e inicie um movimento de resgate das muitas belezas e preciosas riquezas espirituais e litúrgicas que foram desprezadas como se nada valessem. E sempre, de novo e de novo, vêem-se frustrados.

    Paulo VI disse que a fumaça de Satanás havia penetrado na Igreja, por alguma fresta. Ele também admitiu que a Igreja, naquele momento-chave, se encontrava "numa hora de inquietação, de autocrítica, dir-se-ia mesmo de autodemolição...". Mas, se ele notou isso, porque não interrompeu o processo  de destruição enquanto estava no início? Quando ainda era possível fazê-lo com relativa facilidade? E porque, de lá para cá, todos os seus sucessores se comportaram de maneira idêntica?

    Nunca compartilhamos da expectativa nada realista daqueles que supunham que Leão XIV revertesse a revolução do Vaticano II e os estragos — que foram terrivelmente intensificados durante o desastroso reinado de Francisco — da noite para o dia. Três meses, porém, é tempo suficiente para que ele pudesse, no mínimo, ter se manifestado contra as heresias desenfreadas que prevalecem entre seus bispos, ou que tivesse já acenado aos católicos tradicionais para que levantassem suas cabeças, porque não seriam mais perseguidos por aqueles que deveriam protegê-los.

    
Cada dia de silêncio de Leão XIV aumenta a crueldade da revolução do Vaticano II, a ponto de ele correr o risco de incorrer no julgamento de sua própria mensagem do Angelus: "Não podemos rezar a Deus como 'Pai' e depois sermos duros e insensíveis com os outros".

    
Rezemos para que ele preste atenção às suas próprias palavras enquanto tem tempo. Imaculado Coração de Maria, rogai a Deus por nós!

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Fonte:
Robert Morrison, "Pope Leo XIV and the Cruel Reality of the Vatican II Revolution", para o The Remnant, disp. em:
https://remnantnewspaper.com/web/index.php/articles/item/7870-pope-leo-xiv-and-the-cruel-reality-of-the-vatican-ii-revolution
Acesso 30/7/2025.

2 comentários:

  1. Salve Maria!

    Por favor, compartilhe a fonte completa do estudo "2025 do National Bureau of Economic Research (NBER) recentemente citado pelo Rorate Caeli" citado no texto.

    Obrigado!

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