A Assunção da Santíssima Virgem Maria

Francesco Botticini (1475-6), 'A Assunção da Virgem'

POR MAIS QUE REFLETÍSSEMOS, por mais que nos esforçássemos e exercitássemos a imaginação, jamais seríamos capazes de conceber uma glória maior do que a que recebeu a santíssima Virgem Maria, – que foi escolhida para ser a mãe de Jesus, isto é, ser mãe do Filho de Deus e, portanto, Mãe de Deus.

    Entenda-se que Maria Mãe de Deus não é uma doutrina meramente humana, “inventada” pela Igreja muitos séculos após os eventos narrados nos Evangelhos, como imaginam alguns. Se cremos nas Sagradas Escrituras, precisamos aceitar que foi Deus mesmo Quem deu este título à Virgem de Nazaré, quando o Espírito Santo, pela boca de Isabel, a saudou chamando-a “mãe do meu Senhor” (Lc 1,39-45), – sendo que o título “Senhor”, aqui, inegavelmente quer dizer Deus, como em todo o contexto bíblico. – Quando chamamos Maria Mãe de Deus, é isto o que confessamos: do ventre virginal de Maria veio Deus, Nosso Senhor, ao mundo. Por isso é que Maria é Nossa Senhora e nossa Mãe do Céu. Também por isso quis Deus lhe conceder as maiores recompensas. Terminado o seu tempo de vida terrestre, Maria foi “assunta”, levada ao Céu, em corpo e alma.

    Diz uma antiga e piedosa tradição (não a Sagrada Tradição) que Maria de fato não morreu, apenas “dormiu” e, então, foi levada aos Céus pelos arcanjos São Gabriel e São Miguel. Trata-se da chamada "dormição de Maria". Desse modo, teria Nosso Senhor conservado a integridade da carne daquela de quem quis tomar sua própria carne, para a salvação do mundo. Desse modo, a Virgem Maria teria sido assunta aos Céus imediatamente após o fim de sua vida terrena, sendo que seu corpo não teria sofrido corrupção como sucederá aos homens e mulheres que ressuscitarão até o fim dos tempos.

    Esta tradição, porém, não é dogma da Igreja. Outras correntes de pensamento, também muito antigas e dignas de atenção, refletem que, se até mesmo o próprio Deus feito homem conheceu a morte, todo ser humano, sem nenhuma exceção, também haverá de experimentá-la (até mesmo aqueles que estiverem vivos por ocasião da Segunda Vinda do Cristo).

    Fato é que ao definir o dogma sobre a Assunção da Virgem, o Papa Pio XII preferiu não se pronunciar sobre essa questão: passou a Mãe do Senhor pela morte e ressurreição antes de entrar na Bem-aventurança celeste? Foi elevada diretamente da vida mortal ao Triunfo eterno? Diante do silêncio prudente e intencional do Magistério da Igreja sobre o assunto, fica ao arbítrio de cada fiel crer ou não na ressurreição de Maria.

    A Assunção de Nossa Senhora, todavia, foi sempre transmitida no correr dos séculos. Não se encontra explicitamente nas Sagradas Escrituras, mas poderíamos dizer que está implícita em seu contexto. O testemunho preservado dos primeiros cristãos dá conta de que, na ocasião de Pentecostes, Maria Santíssima tinha aproximadamente 47 anos de idade. Permaneceu ela por mais 25 anos na Terra, a educar e formar a Igreja nascente, como outrora educara e protegera Deus Filho em sua infância. Conforme a opinião mais comum, terminou sua imensa missão neste mundo com a idade de 72 anos.

    Diversos Padres da Igreja atestam que os Apóstolos foram milagrosamente levados à Jerusalém na noite que precederia o desenlace da Bem-aventurada Virgem Maria1. S. João Damasceno, um dos mais ilustres doutores da Igreja Oriental, atesta que os fiéis de Jerusalém, ao avisados do falecimento da Mãe querida (como a chamavam), vieram em multidão prestar-lhe as últimas homenagens, e que se multiplicaram os milagres ao redor do seu corpo. Três dias depois chegou S. Tomé Apóstolo, que pediu para ver o corpo da Virgem. Ao retirar-se a pedra, não se achava mais o corpo. Pela Virtude do Filho, ressuscitara Maria. Alma e corpo imaculado vivem na Glória celeste.

    Estas antigas tradições da Igreja sobre o Mistério da Assunção da Mãe de Deus podem ser encontradas nos escritos dos Santos Padres e Doutores da Igreja dos primeiros séculos, e relatadas no Concílio geral de Calcedônia, de 451.



    A solenidade da Assunção de Maria, no início era chamada “Dormição” de Nossa Senhora, pelos motivos que expostos no início. A celebração foi oficializada aos católicos orientais no século VII, com um édito do imperador bizantino Maurício. Ainda no ano 687, a Festa foi introduzida também em Roma pelo Papa Sérgio I, quando foi em procissão à Basílica de Santa Maria Maior celebrar o Santo Ofício. Logo depois, o nome “dormição” cedeu ao de “assunção”, como permanece até os nossos dias.

    A assunção é o evento culminante da existência de Maria. Para a Igreja, depois da definição do papa Pio XII, com a Constituição dogmática Munificentissimus Deus (1950), é dogma; verdade a ser aceita pela fé. E esse processo de convicção de fé se explica – e a definição dogmática pontifícia se justifica – não somente pela Tradição, mas também pelo fato de a Assunção de Maria encontrar sua raiz implícita e indireta também no testemunho da Sagrada Escritura tal como foi gradualmente lida e aclarada pelos Padres da Igreja, pelos teólogos e pelo senso da fé dos santos sob a ação iluminadora do Espírito Santo, Inspirador da Palavra de Deus por escrito e Fiador da autenticidade da fé da Igreja de Cristo.
Aspectos desta verdade mariana:

    1. Cristológico: a Mãe é “assemelhada” ao Filho glorioso; seguiu-o na fase definitiva e gloriosa de sua existência.

    2. Eclesiológico: a Igreja, que tem em Maria o seu início e a sua imagem perfeita, também nela, que sobe ao Céu, pode contemplar seu futuro e ter um sinal de consolação e de segura esperança da própria realização.

    3. Mariológico: Maria alcançou a plenitude de sua salvação e a realização de sua existência como criatura humana amada por Deus de modo sublime.

    4. Antropológico: o humano alcançou nela, por favor divino, a plenitude de sua realização integral; nela pode, pois, contemplar o futuro a ele prometido por Deus e nessa contemplação reavivar o desejo de alcançá-lo.

    A Festa da Assunção, enfim, convida-nos a meditar sobre a glória inefável concedida à Santíssima Virgem, “Porta do Céu” e “Refúgio dos Pecadores”. Nesta meditação, como dissemos no início, quanto mais o homem procura aprofundar-se no conhecimento de Deus, mais compreende que não conseguirá abarcá-Lo, tais as grandezas e mistérios com que se depara.

    Deus Criador, – Todo-Poderoso e Todo-Sapiente, – estabelece as regras, mas podemos ver que se apraz em criar magníficas exceções, que muito nos inspiram. Uma criatura não poderia ter sido feita em grau mais excelente, ensina a Teologia: Maria, sendo humana, não poderia ser mais perfeita. Ela é o próprio Tabernáculo de Deus da nova e eterna Aliança, que por meio dela se doa aos Bem-aventurados. Maria é a Mãe da Vida!

    ** Leia um estudo mais completo sobre o dogma da Assunção de Nossa Senhora


__________________________
Lembre-se de nos acompanhar também nas redes sociais:

** Facebook

*** Instagram (@ofielcatolico)

**** Youtube


__________
1. Alguns autores primitivos/patrísticos que trataram o tema: Pseudo-Melito de Sardes, Epifânio de Salamissa, Timóteo de Jerusalém, João o Teólogo, Gregório de Tours, Teoteknos de Livias, Modesto de Jerusalém, Germano de Constantinopla, São João Damasceno. Algumas obras primitivas sobre a assunção da Virgem Maria são: A Dormição da Santa mãe de Deus (João o Teólogo); A passagem da abençoada virgem Maria (José de Arimateia); A passagem da abençoada virgem Maria (Melito de Sardes); Homilia sobre a Dormição (Cirílo de Jerusalém); Homilia sobre a Dormição (Evódio de Roma); Homilia sobre a Dormição (Teodósio de Alexandria); Homilias sobre a Dormição da virgem (João Damasceno); “Os Seis Livros Apócrifos” (séc. IV)
_____
Fontes:
• ‘Assunção da Virgem Maria’, Portal Paulinas, disp. em:
paulinas.org.br/diafeliz/?system=santo&id=355#ixzz3gRq9pXjO
Acesso 20/7/015
• Revista Arautos do Evangelho, Agosto/2004, n. 32, p. 18 à 20
• SAADEH, Fr. Ya’cub H. Saadeh; MADROS, Fr. Peter H. Fé e Escritura, 2ª ed. São Paulo: Loyola, 1995, pp. 161-162.
• LEXICON, dizionario teologico enciclopedico. Casale Monferrato: Piemme Spa, 1993, pp.56-58
www.ofielcatolico.com.br

11 comentários:

  1. Por que são raríssimas imagens da virgem Maria idosa?

    ResponderExcluir
  2. Excelente post. Peçamos a Nossa Mãe do Céu que rogue a Jesus por nós.

    ResponderExcluir
  3. tem algum(s) texto bíblico que fala de quando Maria foi levada aos céus?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Salve Maria!!

      Olá Gabi. eu sei que a maioria dos nossos irmãos aqui no site andam bastante ocupados então eu vou tentar te Ajudar com o pouco que aprendi sobre este assunto que eu acho bem delicado. Para dizermos que Maria subiu ao céu usamos a palavra ASSUNÇÃO. O dogma da Assunção foi definido pelo Papa PIO XII em 1950
      A palavra “assunção” significa ser assumido, então cremos que Maria foi assumida, levada, entronizada no céu. Céu é a dimensão invisível da criação onde Deus quis habitar. Existe também a palavra [ASCENÇÃO] que quer dizer [elevar-se com as próprias forças] é o caso de Jesus quando subiu ao céu. A definição diz que a Igreja crê que a mãe de Jesus, transcorridos os seus dias na terra foi elevada ao céu de corpo e alma, entretanto, afirmar que Maria subiu ao céu “de corpo e alma” gera questionamentos. A tradição mais antiga da Igreja afirma que Maria morreu, assim como seu Filho Jesus. Há até o sepulcro de Maria em Jerusalém. Ao declarar o dogma da assunção, o Papa PIO XII evitou dar uma palavra final sobre esta questão e preferiu escrever o seguinte artigo:- “encerrado o curso de sua vida na terra, Maria foi assumida no céu de corpo e alma”. Como ela concluiu o seu tempo na terra, não é um dado histórico ao qual temos acesso. A fé católica diz que só a mãe de Jesus está totalmente na glória de Deus. Todos os que morreram, esperam a ressurreição final. Eles estão em Cristo, mas seus corpos ainda não foram glorificados. Maria, porém, porque viveu na fidelidade ao Pai, na acolhida do Filho e na docilidade ao Espírito de forma total, já mereceu receber toda recompensa que Deus preparou para os seus eleitos. Nela a humanidade encontra o modelo e o início do que acontecerá com todos, quando terra e céu estiverem em plena comunhão. Mas para exclarecer ainda melhor este assunto vou deixar aqui um vídeo do You Tube de um eis Pastor que hoje é católico, nosso irmão Paulo Leitão Em defesa da Fé. https://www.youtube.com/watch?v=FiPEDW9IGxI
      Ele esclarece muito bem este assunto e cita até algumas passagens bíblicas que deixar a assunção de Maria inda mais evidente.

      Excluir
  4. Paulo disse que os cristãos só iriam ressuscitar e ir para o céu na vinda de Cristo,não há um conflito?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Já tratamos essa questão, Glaysom, no estudo que você pode ler acessando o link abaixo:

      A morte, o Juízo Particular e o Juízo Final

      A Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo

      Apostolado Fiel Católico

      Excluir
  5. Comentando um ponto do texto, o arrebatamento de Elias em vida não contraria a linha de pensamento de que todo ser humano deve passar pela morte, sem exceção?

    Samantha

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Esta é uma dificuldade para a qual a Teologia, bem como a própria Dogmática, não nos oferece uma resposta pronta e fechada, Samantha. Alguns teólogos dizem que Elias, ao ser arrebatado, faleceu e logo em seguida retornou à vida. O mesmo vale para Maria.

      Mas essas são questões em aberto, para as quais não temos resposta "oficial" e definitiva da Igreja.

      A Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo

      Apostolado Fiel Católico

      Excluir
  6. Boa tarde, prezados.

    De fato, a morte de Nossa Senhora é um mistério, tanto em como quanto onde e em que momento ocorreu. Entretanto, pelo relato textual, diz-se que ela teria sido assunta 25 anos após a morte de Cristo. Há outros textos afirmando que foram apenas 2 anos após a morte de Cristo. Eu acredito que essa segunda hipótese seja mais plausível, justamente para não entrar em conflito com a tradição da aparição de Maria ao apóstolo Tiago, na Espanha, e isso em 40 depois do nascimento (e não morte) de Cristo.

    ResponderExcluir
  7. Boa noite! Por favor, vocês poderiam me indicar uma bibliografia católica a respeito da exegese do Apocalipse..sobre escatologia. Gostaria de entender sobre os acontecimentos, sobre a grande tribulação, sobre as posições pré, pós, milenarismo, etc e sobre o que a Igreja ensina claramente sobre isso tudo. Já li um artigo que tem aqui no blog, mas gostaria de ter indicações de livros mais aprofundados. Desde já, agradeço e Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo!

    ResponderExcluir
  8. A matéria eleva a fé católica a respeito da Assunção de Maria, porém, coloca em dúvida o entendimento dos fiéis a respeito da ressurreição imediata de Maria e intercessão dos santos porque, conforme relato de quem escreveu que o Papa Pio XII baseado na tradição (a não tradição sagrada) não quis se manifestar a respeito da ressurreição. Lembrando é claro que os que irão ficar confusos é porque não levaram em consideração a qual tradição o papa se baseou para ficar em silêncio.

    ResponderExcluir

** Inscreva-se para a Formação Teológica da FLSP e além das aulas mensais (com as 4 disciplinas fundamentais da Teologia: Dogmática, História da Igreja, Bíblia e Ascética & Mística) receba acesso aos doze volumes digitais (material completo) do nosso Curso de Sagradas Escrituras, mais a coleção completa em PDF da revista O Fiel Católico (43 edições), mais materiais exclusivos e novas atualizações diárias. Para assinar agora por só R$13,90, use este link. Ajude-nos a continuar trabalhando pelo esclarecimento da fé cristã e católica!

AVISO aos comentaristas:
Este não é um espaço de "debates" e nem para disputas religiosas que têm como motivação e resultado a insuflação das vaidades. Ao contrário, conscientes das nossas limitações, buscamos com humildade oferecer respostas católicas àqueles sinceramente interessados em aprender. Para tanto, somos associação leiga assistida por santos sacerdotes e composta por profissionais de comunicação, professores, autores e pesquisadores. Aos interessados em batalhas de egos, advertimos: não percam precioso tempo (que pode ser investido nos estudos, na oração e na prática da caridade) redigindo provocações e desafios infantis, pois não serão publicados.

Subir